John Wesley
'Em que vós grandemente vos
alegrais, ainda que agora importa, sendo necessário, que estejais por um pouco
contristados com várias tentações'
(I Pedro 1:6)
1.
No discurso precedente, eu falo, em específico, daquela escuridão de mente,
para a qual vão, aqueles que uma vez caminharam na luz do semblante de Deus, e
caíram. Proximamente relacionado a isto está o peso da alma, que é ainda mais
comum, mesmo entre os crentes. De fato, quase todos os filhos de Deus experimentam
isto, em um grau maior ou menor. E tão grande é a semelhança entre um e outro,
que eles freqüentemente os confundem, e se sentem aptos a dizerem
indiferentemente: 'Tal está na escuridão'; ou 'Tal pessoa está
oprimida'; -- como se eles fossem termos equivalentes; um dos quais implica
não mais do que o outro.
Mas
eles estão longe disto. Escuridão é uma coisa; opressão é outra. Existe uma
diferença; sim, uma diferença ampla e essencial, entre a primeira e a última. E
tal diferença, todos os filhos de Deus devem estar profundamente interessados
em compreender: Do contrário, nada será mais fácil para eles, do que trocar
opressão por escuridão. Com o objetivo de prevenir isto, eu me esforçarei para
mostrar:
I.
Quais
são aquelas pessoas a quem o Apóstolo diz: 'Vocês estão contristados'.
II.
Em
que tipo de opressão elas se encontram:
III.
Quais
são as causas dela:
IV.
Qual
a finalidade dela:
V.
Devo
concluir com algumas inferências.
I
1.
Em primeiro Lugar, eu vou mostrar, como são aquelas pessoas a quem o Apóstolo
diz: 'Vocês estão oprimidos'. Para começar, está acima de qualquer disputa,
que eles eram crentes, no momento em que o Apóstolo se dirigiu a eles: Uma vez
que ele diz expressamente: (I Pedro 1:5) 'Que mediante a fé estais
guardados na virtude de Deus para a salvação, já prestes para se revelar no
último tempo'. E novamente em (I Pedro 1:7), ele menciona: 'Para
que a prova da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro que perece e é
provado pelo fogo, se ache em louvor, e honra, e glória, na revelação de Jesus
Cristo'. E de novo em (I Pedro 1:9), ele fala de eles 'Alcançarem
a finalidade da vossa fé, a salvação das vossas almas'. Ao mesmo tempo,
portanto, que eles estavam 'em opressão', eles estavam possuídos da fé
viva. A Opressão deles não destruiu a fé deles: Eles ainda 'persistiam em
ver a Ele que é invisível'.
2.
Nem a opressão destruiu a paz deles; 'a paz que ultrapassa todo
entendimento'; que é inseparável da fé verdadeira e viva. Isto nós podemos
facilmente reunir do segundo verso, em que o Apóstolo não diz que a graça e a
paz podem ser dadas a eles; mas, tão somente, que elas poderão 'ser
multiplicadas junto a eles'; que a bênção, que eles já desfrutam, poderia
ser mais abundantemente conferida junto a eles.
3.
As pessoas das quais o Apóstolo aqui fala estavam também cheias de uma
esperança viva. Porque assim ele fala em (I Pedro 1:3) 'Bendito seja
o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que, segundo a sua grande
misericórdia, nos gerou de novo para uma esperança viva, pela ressurreição de
Jesus Cristo dentre os mortos', -- eu e você, todos nós que somos 'santificados
pelo Espírito', e desfrutamos 'do sangue aspergido de Jesus Cristo',
-- 'para uma esperança viva, para uma herança', -- ou seja, para a
esperança viva de uma herança, 'incorruptível, imaculada, e que não se
desvanece'. De modo que, não obstante sua opressão, eles ainda retém uma
esperança cheia da imortalidade.
4. E
eles ainda se 'regozijam na esperança da glória de Deus'. Eles foram
preenchidos com a alegria no Espírito Santo. Assim, em (I Pedro 1:8), o
Apóstolo, tendo justamente mencionado 'a revelação' final 'de Jesus
Cristo' (ou seja, quando Ele começa a julgar o mundo), ele imediatamente
acrescenta, 'em quem, vocês não podem ver agora'; não com seus olhos
corpóreos, 'ainda assim, crêem, vocês se regozijam com alegria inexprimível
e cheia de glória'.
(I Pedro 1:7-9) 'Para que a prova da vossa fé,
muito mais preciosa do que o ouro que perece e é provado pelo fogo, se ache em
louvor, e honra, e glória, na revelação de Jesus Cristo; ao qual, não o havendo
visto, amais; no qual, não o vendo agora, mas crendo, vos alegrais com gozo
inefável e glorioso; - Alcançando o fim da vossa fé, a salvação das vossas
almas'.
A
opressão deles, portanto, não era apenas consistente com aquela esperança viva,
mas também com a alegria inexprimível: Ao mesmo tempo em que eles estavam assim
oprimidos, eles, apesar disto, eles se regozijavam com alegria cheia de glória.
5.
Em meio à opressão, eles igualmente ainda desfrutavam do amor de Deus, que
derramava por todo seus corações, -- 'a que', diz o Apóstolo, 'não
tendo visto, vocês amam'. Embora não vejam, face a face; vocês, conhecendo
a Ele, pela fé, têm obedecido à sua palavra: 'Meu filho, dê-me seu coração'.
'Ele é seu Deus, e o seu amor; o desejo de seus olhos; e a sua grande
recompensa'. Vocês têm buscado, e encontrado a felicidade Nele; vocês 'se
deleitam no Senhor', e dão a Ele o 'desejo de seus corações'.
6. Uma
vez mais: Embora eles estivessem oprimidos, ainda assim, eles eram
santos; eles retiveram o mesmo poder sobre o pecado. Eles ainda estavam 'protegidos'
disto, 'pelo poder de Deus'; eles eram 'filhos obedientes, não
modeladas de acordo com seus desejos anteriores'; mas 'como Aquele que
os havia chamado era santo'; então, eles eram 'santos em todas as formas
de conversação'. Sabendo que foram 'redimidos pelo precioso sangue de
Cristo, como um Cordeiro, sem mácula, e sem culpa'; eles, através da fé e
esperança que tinham em Deus, 'purificaram suas almas, através do Espírito'.
Assim sendo, o que se conclui é que a opressão deles era constituída com a fé,
com a esperança, com o amor de Deus e homem, com a alegria no Espírito Santo,
com a santidade interior e exterior. Eles, de modo algum diminuíram, muito
menos, destruíram, alguma parte da obra de Deus em seus corações. Ela não se
interpôs com aquela 'santificação do Espírito', que é a raiz de toda
obediência verdadeira; nem com a felicidade que precisa resultar da graça e paz
reinando no coração.
II
1.
Disto, nós podemos facilmente aprender o tipo de opressão que eles tinham; -- e
que, em Segundo Lugar, eu me esforçarei para mostrar. A palavra no original,
"islupEthentes", -- feito pesaroso, afligido; de lupE, -- aflição ou
tristeza. Este é o significado constante, literal, da palavra: E isto, sendo
observado, não existe ambigüidade na expressão; nem alguma dificuldade na
compreensão dela. As pessoas, das quais se fala aqui, estavam afligidas: A
opressão em que eles se encontravam, não era, nem mais, nem menos, do que
tristeza ou aflição; -- uma paixão que todo filho do homem está bastante
familiarizado.
2. É
provável que nossos tradutores a interpretaram como opressão (embora uma
palavra menos comum) para denotar duas coisas: Primeiro, o grau; e em seguida,
a continuidade dele. De fato, parece que não se trata de um grau insignificante
ou inconsiderado de aflição, de que se fala a respeito aqui; mas de tal que
causa uma forte impressão sobre a alma, e a faz deprimir-se. Nem ela parecer
ser uma tristeza temporária, tal que passa em uma hora; mas, antes, tal que se
segura com firmeza no coração, e que não desaparece rapidamente, mas continua
por algum tempo, como um temperamento enraizado, preferivelmente, do que uma
paixão, -- mesmo naqueles que têm a fé viva em Cristo, e o amor genuíno de Deus,
em seus corações.
3.
Mesmo nesses, essa opressão pode ser, algumas vezes, tão profunda, que
obscurecesse toda a alma; para dar uma aparência de verdade, por assim dizer, a
todas as afeições, tais que irão aparecer em todo o comportamento. Ela pode igualmente
ter uma influência sobre o corpo; particularmente, naqueles que são tanto de
uma constituição naturalmente fraca, ou estão enfraquecidos por alguma doença
acidental, especialmente, do tipo nervoso. Em muitos casos, nós nos
certificamos que 'o corpo corruptível deprime a alma'. E nisto, a alma,
certamente, deprime o corpo, e o enfraquece mais e mais. Eu não direi que a
tristeza profunda e duradoura do coração não pode, algumas vezes, enfraquecer
uma constituição forte, e causar tais desordens corpóreas, não facilmente
removidas: No entanto, tudo isto pode ainda consistir com a medida daquela fé
que é operada pelo amor.
4.
Esta bem pode ser denominada uma 'provação ardente': E embora não seja a
mesma que o Apóstolo fala no quarto capítulo [I Pedro 4:12 'Amados, não
estranheis a ardente prova que vem sobre vós para vos tentar, como se coisa
estranha vos acontecesse']; ainda assim, muitas das expressões lá usadas,
com respeito aos sofrimentos exteriores, podem ser adaptadas a essa aflição
interior. Na verdade, elas não podem, com alguma propriedade, serem aplicadas
àqueles que estão na escuridão: Esses, não podem regozijar-se; nem é verdade
que 'o Espírito da glória e de Deus repousa sobre' eles. Mas Ele
freqüentemente o faz naqueles que estão na opressão; de modo que, embora
pesarosos, eles, mesmo então, se regozijam sempre.
III
1.
Mas para prosseguir para o Terceiro ponto: Quais são as causas de tal tristeza
ou opressão em um verdadeiro crente? O Apóstolo nos diz claramente: 'Vocês
estão contristados', diz ele, 'pelas múltiplas tentações';
múltiplas, não apenas muitas em número, mas de muitos tipos. Elas podem ser
variadas e diversificadas, em milhares de formas, pela mudança ou adição de
numerosas circunstâncias. E esta mesma diversidade e variedade tornam mais
difícil nos protegermos delas. Entre essas nós podemos classificar todas as
doenças corpóreas; particularmente, as enfermidades repentinas, e a dor
violenta de todo tipo; quer afetando o corpo todo, ou a menor parte dele. É
verdade, que aqueles que têm desfrutado de saúde ininterrupta, e não têm
sentido qualquer uma dessas enfermidades podem fazer pouco delas; e se
admirarem de que a doença ou a dor do corpo possa trazer opressão sobre a
mente. Talvez, um, em mil, seja de uma constituição tão peculiar, que não sinta
dor como os outros homens. De modo que Deus tem se agradado de mostrar seu
poder, produzindo alguns desses prodígios da natureza, que parecem não se
preocupar com a dor, afinal; mesmo a dos tipos mais severos, se este desprezo
pelas dores não se dever parcialmente à força da educação; e, parcialmente, a
uma causa sobrenatural, -- ao poder tanto dos bons, quanto dos maus espíritos,
que elevam estes homens, acima do estado da mera natureza. Mas, abstraindo
esses casos particulares, em geral, a justa observação é que a dor é miséria
plena e extrema; aniquilando completamente toda resignação. E mesmo onde esses
são protegidos pela graça de Deus; onde os homens 'mantêm suas almas
pacientes, ela pode, não obstante, ocasionar muita opressão interior; com a
alma compadecendo-se do corpo.
2.
Todas as enfermidades de longa duração, embora menos dolorosas, estão aptas a
produzirem o mesmo efeito. Quando Deus determina sobre nós a consumação, ou a
febre intermitente, que esfria e queima, se ela não for rapidamente removida,
não irá apenas 'consumir os olhos', mas 'causará tristeza no
coração'. Este é eminentemente o caso, com respeito a todas estas que são
denominadas doenças nervosas. E a fé não destrói o curso da natureza: As causas
naturais ainda produzem efeitos naturais. A fé não mais impede os declínios dos
espíritos (como se diz), em uma doença histérica que surge da agitação de uma
febre.
3.
Novamente: quando 'a calamidade vem como um redemoinho de vento, e a
escassez como um homem armado'; trata-se de uma pequena provação? Não é
estranho que ela cause tristeza e opressão? Mesmo que esta seja uma coisa
pequena para aqueles que se mantêm a uma distância, ou que olham, e 'passam,
pelo outro lado'; ainda assim, por outro lado, é dessa forma, para aqueles
que a sentem. 'Tendo alimento e vestimenta' (de fato, a última palavra,
skepasmata, sugere moradia, assim como, vestuário), nós podemos, se o amor de
Deus está em nossos corações, 'estarmos satisfeitos com isto'. Mas o que
devem fazer aqueles que nada têm? Quem, por assim dizer, 'adotam a rocha
como abrigo?'. Que têm apenas a terra para se deitar, e apenas o céu para
cobri-los? Que não têm uma residência seca, quente, nem mesmo limpa, para si
mesmos, e seus pequeninos; nenhuma roupa para mantê-los, ou àqueles a quem eles
amam, junto a si mesmos, do frio penetrante, tanto do dia, quanto da noite? Eu
rio do estúpido pagão clamando: 'Quão ridículos os homens podem ser!'.
A
pobreza tem alguma coisa pior, do que fazer os homens serem capazes de rirem
dela? É um sinal de que esse poeta inútil falou, sem pensar, das coisas que ele
não conhecia. Não é a falta de alimento, alguma coisa pior do que isto? Deus a
decretou como uma calamidade sobre o homem, para que ele possa prover, 'através
do suor de sua testa'. Mas quantos existem, nesta região cristã, que
labutam, e trabalham, e suam, e não o têm, afinal, mas lutam com fraqueza e
fome juntas? Não é pior para alguém, depois de um dia de trabalho, voltar para
sua moradia pobre, fria, suja e desconfortável, e encontrar nem mesmo o
alimento que é necessário para reparar suas forças perdidas? Vocês, que vivem confortavelmente na terra;
que nada necessitam, a não ser, de olhos para verem, ouvidos para ouvirem, e
corações para entenderem o quanto bem Deus tem partilhado com vocês, -- não é
pior buscar o pão, dia a dia, e encontrar nada? Talvez, encontrar o conforto
também de cinco ou seis crianças, clamando pelo que ele não tem para dar! Não
fosse ele refreado por uma mão invisível, ele não poderia logo 'amaldiçoar a
Deus e morrer?'. Ó necessidade de pão! Necessidade de pão! Quem pode dizer
o que isto significa, sem ter sentido isto em si mesmo? Eu estou surpreso que
isto ocasione não mais do que opressão, mesmo nesses que crêem!
4.
Talvez, proximamente a isto, nós possamos colocar a morte daqueles que eram
próximos, e queridos a nós; de um pai jovem, e um que não entrou muito no
declínio dos anos; de uma criança amada, recém surgindo para a vida, e
apertando nossos corações; de um amigo que foi como nossa própria alma, --
próximo à graça de Deus, o último, e o melhor dom do Céu. E milhares de
circunstâncias podem acentuar a aflição. Talvez, a criança e o amigo morreram
em nossos braços! – talvez, foram arrebatados, quando nós não cuidamos deles!
No vigor da juventude, e cortados como uma flor! Em todos esses casos, nós, não
apenas não podemos, mas devemos, estar afligidos: é o objetivo de Deus que
possamos. Ele não nos teria como animais e pedras. Ele não teria nossas
afeições equilibradas, não extintas. Portanto, -- 'A natureza não
repreendida, faz derramar uma lágrima'. Pode haver tristeza, sem pecado.
5.
Uma tristeza ainda mais profunda, nós podemos sentir por aqueles que estavam
mortos, enquanto viviam; com respeito à indelicadeza, ingratidão, apostasia
daqueles que estavam unidos a nós na mais íntima aliança. Quem pode expressar o
que um amante das almas pode sentir por um amigo, um irmão, morto para Deus?
Por um marido, uma esposa, um pai, um filho, precipitando-se no pecado, como um
cavalo dentro da batalha; e, a despeito de todos os argumentos e persuasões,
apressando-se para executar a sua própria condenação? E esta angústia do
espírito pode ser intensificada a um grau inconcebível, ao se considerar que
ele que agora caminha para a destruição, uma vez, seguiu bem no caminho da
vida. O que quer que ele tenha sido no passado, serve agora a nenhum outro
propósito, do que nos fazer refletir no que ele está mais penetrado e afligido.
6. Em
todas essas circunstâncias, nós podemos estar seguros de que nosso grande
adversário não ficará sem aproveitar sua oportunidade. Ele, que sempre 'tem
andado buscando a quem ele possa devorar', irá, então, usar, especialmente,
todos os seus poderes, todas as suas habilidades, se, por acaso, ele puder
obter alguma vantagem sobre a alma que já está subjugada. Ele não poupará seus
dardos certeiros, tais que são mais adequados para encontrarem uma entrada, e
fixarem-se mais profundamente no coração, porque são próprios das tentações que
o assaltam. Ele irá trabalhar para injetar os pensamentos descrentes, blasfemos
ou descontentes. Ele irá sugerir que Deus não cuida, e não governa, a terra;
ou, pelo menos, que Ele não a governa da maneira correta; não, através da
justiça e misericórdia. Ele irá se esforçar para incitar o coração contra Deus;
para renovar nossa inimizade natural contra Ele. E se nós empreendemos lutar
com Ele, com as suas próprias armas, nós iremos raciocinar com ele, e mais e
mais opressão, irá, sem dúvida, resultar, se não, escuridão extrema.
7.
Freqüentemente se supõe que existe uma outra causa; se não, da escuridão, pelo
menos, da opressão; ou seja, Deus se retira da alma, porque é sua vontade
soberana. Certamente, Ele irá fazer isto, se nós afligirmos seu Espírito Santo,
tanto por pecado exterior, quanto exterior; tanto por fazer o mal; por
negligenciar a fazer o bem; dando oportunidade para o orgulho ou ira; para a
indolência espiritual; para o desejo tolo, ou afeições desordenadas. Mas que
Ele sempre se retira, porque Ele quer; meramente porque é seu bom prazer, eu
absolutamente nego. Não existe um texto em toda a Bíblia que faz qualquer
menção a tal suposição. Mais do que isto: trata-se de uma suposição contrária;
não apenas a muitos textos particulares, mas a todo o teor das Escrituras. É
repulsiva à própria natureza de Deus: É extremamente inferior à sua majestade e
sabedoria, (como um escritor eminente, expressa fortemente), 'brincar de
esconde-esconde com suas criaturas'. É inconsistente, com sua justiça e
misericórdia, e com a profunda experiência de todos os seus filhos.
8.
Uma causa mais da opressão, é mencionada por muitos daqueles que são
denominados autores místicos. E a noção tem se arrastado, eu não sei como, até
mesmo entre as pessoas sinceras que não têm familiaridade com eles. Eu não
posso explicar isto melhor, do que nas palavras de uma recente escritora, que
relata isto como sua própria experiência: -- 'Eu continuei tão feliz no meu
Amado, que, mesmo que eu tivesse sido forçada a perambular no deserto, eu não
teria encontrado dificuldade nisto. Este estado, porém, não durou muito,
quando, em efeito, eu me encontrei conduzida ao deserto. Eu me achei numa
condição de desamparo, completamente pobre, desgraçada e miserável. A fonte
apropriada desta aflição, o conhecimento de nós mesmos; através do qual, nos
certificamos que existe uma extrema dessemelhança entre Deus e nós. Nós nos
vemos em maior oposição a Ele; vemos que no fundo de nossa alma, somos
inteiramente corruptos, depravados, e cheios de toda espécie de mal e
malignidade, do mundo e da carne; e todas as sortes de abominações'. –
Disto, pode-se concluir que o conhecimento de nós mesmos, sem o que podemos
perecer eternamente, deve, mesmo depois de termos conseguido a justificação
pela fé, nos ocasionar a mais profunda opressão.
9.
Mas, sobre isto, eu observaria:
(1)
No
parágrafo precedente, esta escritora diz: 'Compreendendo que eu não tinha a
fé verdadeira em Cristo, eu me entreguei a Deus, e imediatamente senti seu
amor'. Pode ser; e ainda assim, não parece que isto foi justificação. É
mais provável que não foi mais do que é usualmente denominado de 'As
delineações do Pai'. E se for assim, o peso e a escuridão que se seguem,
não são outra coisa, que a convicção do pecado; que na natureza das coisas,
deve preceder aquela fé, por meio da qual somos justificados.
(2)
Supondo-se
que ela fosse justificada, quase no mesmo momento em que ela foi convencida da
falta de fé, não houve, então, tempo para aquele crescimento gradual do
autoconhecimento, que costuma preceder a justificação: Neste caso, portanto, ele
veio depois, e foi, provavelmente, o mais severo, o menos esperado.
(3)
Pode
ser que vá existir um conhecimento de nosso pecado inato, de nossa corrupção
total pela natureza, mais profundo, mais claro e mais completo, depois da
justificação, e que nunca houve antes dela. Mas esta necessidade não ocasiona
obscuridade da alma: Eu não direi que ela deva nos trazer para a opressão. Se
fosse assim, o Apóstolo não teria usado aquela expressão; se fosse preciso,
haveria uma necessidade absoluta e indispensável dele, para todos que
conhecessem a si mesmos; ou seja, em efeito, para todos que conhecessem o amor
perfeito de Deus, e fossem, por meio disto, 'feitos adequados para serem
parceiros na herança dos santos na luz'. Mas isto, de modo algum, é o caso.
Ao contrário, Deus pode aumentar o conhecimento de nós mesmos em algum grau; e
aumentar na mesma proporção, o conhecimento de Si mesmo e a experiência de Seu
amor. E, neste caso, não haveria 'deserto, miséria, condição de abandono';
mas amor, paz, e alegria, gradualmente brotando para a vida eterna.
IV
1.
Para que finalidade, então, (a Quarta coisa que deverá ser considerada) Deus
permite que a opressão caia sobre tantos de seus filhos? O Apóstolo nos dá uma
resposta clara e direta a esta importante questão: - 'Para que a prova da
vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro que perece e é provado pelo fogo,
se ache em louvor, e honra, e glória, na revelação de Jesus Cristo' (I
Pedro 1:7). Pode haver uma alusão a isto, naquela bem conhecida passagem do
quarto capítulo (embora primeiramente relacione-se a quase outra coisa, como já
foi observado): 'Amados, não estranheis a ardente prova que vem sobre vós
para vos tentar, como se coisa estranha vos acontecesse; mas alegrai-vos no
fato de serdes participantes das aflições de Cristo, para que também na
revelação da sua glória vos regozijeis e alegreis' (I Pedro 4:12,
&c).
2.
Disto, nós aprendemos que a primeira e grande finalidade de Deus permitir as
tentações, que trazem opressão sobre seus filhos, é testar a fé deles, que é
testada por elas, como o ouro, pelo fogo. Agora, nós sabemos que o ouro tentado
no fogo, é purificado, através dele; é separado de sua impureza. E assim é a
fé, no fogo da tentação; quanto mais ela é tentada, mais é purificada; -- sim,
e não apenas purificada, mas também fortalecida, confirmada, abundantemente
aumentada, por tantas mais provas de sabedoria e poder, o amor e fidelidade de
Deus. Por isto, então, -- para aumentar nossa fé, -- é uma das graciosas
finalidades de Deus permitir essas múltiplas tentações.
3.
Elas servem para experimentarem, purificarem, confirmarem e aumentarem aquela
esperança viva também, onde junto 'a Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo
temos sido recriados de sua abundante misericórdia'. De fato, nossa
esperança não pode deixar de aumentar, na mesma proporção que nossa fé. Sobre
este alicerce, ela se situa: Crendo em Seu nome; vivendo pela fé no Filho de
Deus, nós esperamos; nós temos expectativa confiante da glória que será
revelada; e, conseqüentemente, o que quer que fortaleça nossa fé, aumenta nossa
esperança também. Ao mesmo tempo, em que aumenta nossa alegria no Senhor, que
não pode deixar de atender a uma esperança cheia de imortalidade. Neste
panorama, o Apóstolo exorta os crentes em outro capítulo: 'Regozijem-se
vocês, parceiros dos sofrimentos de Cristo'. A este mesmo respeito, 'felizes são vocês;
porque o Espírito da glória e Deus descansa sobre vocês': E, por meio
disto, somos capacitados, mesmo em meio aos sofrimentos, a 'nos regozijarmos
com alegria inexprimível e cheia de glória'.
4.
Eles se regozijam mais, porque as provas que aumentam a fé e a esperança,
aumentam também seu amor; sua gratidão para com Deus, por todas as suas
misericórdias, e sua boa-vontade para com toda humanidade. Assim sendo, quanto
mais profundamente conscientes eles estão da bondade amorosa de Deus, seu
Salvador, mais seus corações inflamam-se com amor para com Ele que 'primeiro
os amou'. Quanto mais clara e forte a evidência que eles têm da glória que
deverá ser revelada, mais eles amam a Ele que a adquiriu para eles, e 'deu a
eles a garantia' dela, 'em seus corações'. E esta, o aumento de seu
amor, é outra finalidade para que seja permitido que as tentações venham sobre
eles.
5.
Uma outra finalidade ainda, é o crescimento deles na santidade: santidade de
coração; santidade de conversação; a última, resultando da primeira; porque uma
boa árvore produz bons frutos. E toda santidade interior é o fruto imediato da
fé que é operada pelo amor. Através disto, o Espírito abençoado purifica o
coração do orgulho, obstinação, paixão; do amor do mundo, dos desejos tolos e
danosos; das afeições vis e inúteis. Além do que, afeições santificadas têm,
através da graça de Deus, uma tendência imediata e direta à santidade. Através
da operação do seu Espírito, elas humilham e degradam, mais e mais, a alma
diante de Deus. Elas acalmam e abrandam nosso espírito turbulento; submetem a
fúria de nossa natureza; enfraquecem nossa obstinação e vontade própria;
crucificam-nos para o mundo; e nos fazem esperar nossa força, e buscar nossa
felicidade, em Deus.
6.
E todas essas têm como grande objetivo, que nossa fé, esperança, amor, e
santidade 'possam ser encontrados', se eles ainda não apareceram; 'para
o louvor' do próprio Deus; ' e a honra' de todos os homens, e anjos;
'e a glória', imputada, pelo grande Juiz, a todos que perseverarem até o
fim. E isto será imputado naquele dia terrível, a todo homem, 'de acordo com
suas obras'; de acordo com a obra que Deus tem forjado em seu coração, e as
obras exteriores que ele tem forjado para Deus; e igualmente de acordo com o
que ele tem suportado. De modo que todas essas tentações são um ganho
inexplicável. De várias maneiras, essas 'aflições brandas, que são apenas
para o momento, forjam em nós um mais excelente, e eterno ônus de glória!'.
7. Acrescentemos
a isto, a vantagem que outros podem receber, vendo nosso comportamento debaixo
de aflição. Nós nos certificamos, pela experiência, que o exemplo
freqüentemente causa uma impressão mais profunda em nós, do que preceitos. E
quais exemplos têm uma influência mais forte, não apenas naqueles que são
parceiros de igual fé preciosa, mas, naqueles que não têm conhecido a Deus, do
que de uma alma calma e serena, em meio às tempestades; triste, ainda assim,
regozijando-se; humildemente aceitando o que quer que seja da vontade de Deus,
embora seja doloroso para a natureza; dizendo, na doença e dor: 'O cálice
que meu Pai me deu, eu não deverei beber?'. – na perda e necessidade, 'O
Senhor deu; o Senhor tira; abençoado seja o nome do Senhor!'.
V
1.
Eu vou concluir, com algumas inferências. Em Primeiro Lugar, quão ampla
é a diferença entre a escuridão da alma e a opressão; que, não obstante, são
tão geralmente confundidas uma com a outra; mesmo pelos cristãos experientes!
Escuridão, ou estado de deserto, implica uma total perda da alegria no Espírito
Santo: A opressão não; em meio a ela, nós podemos 'nos regozijar com alegria
inexprimível'. Eles que estão na escuridão perderam a paz de Deus. Eles que
estão na opressão não a perderam. Longe disto, naquele mesmo momento, 'a
paz', assim como 'a graça' podem 'ser multiplicadas' junto a
eles. No primeiro caso, o amor de Deus tornou-se frio, se não foi totalmente
extinguido; no segundo, ele retém toda sua força; ou melhor, aumenta, diariamente.
No primeiro, a própria fé, se não totalmente perdida, está, não obstante,
gravemente em declínio: A evidência, e a convicção das coisas que não são
vistas; particularmente, do amor redentor de Deus, não está mais tão clara ou
forte, quanto no passado; e a confiança deles em Deus está proporcionalmente
enfraquecida: No segundo, embora eles não o vejam, ainda assim, têm uma
confiança clara e inabalável em Deus; e uma evidência duradoura do amor, por
meio do qual, seus pecados foram apagados. De modo que, assim como nós podemos
distinguir a fé da descrença; esperança do desespero; paz da guerra; amor a
Deus do amor do mundo; nós podemos infalivelmente distinguir opressão de
escuridão!
2.
Em Segundo Lugar, nós podemos aprender disto, que pode haver necessidade
de opressão; mas não, necessidade de escuridão. Pode haver necessidade de
estamos 'contristados por algum tempo', com o objetivo das finalidades
acima citadas; pelo menos, neste sentido, como resultado natural dessas 'múltiplas
tentações', que são necessárias para testarem e aumentarem nossa fé; para
confirmarem e aumentarem nossa esperança; para purificarem nossos corações de
todos os temperamentos não santos, e aperfeiçoarem-nos no amor. E, em
conseqüência disto, elas são necessárias com o objetivo de fazerem brilhar
nossa coroa, e acrescentarem ao nosso ônus de glória eterna. Mas nós não
podemos dizer que a escuridão seja necessária com o objetivo a algumas dessas
finalidades. De modo algum, ela nos conduz a elas: A perda da fé, esperança, amor,
certamente não é, nem condutiva à santidade; nem aumenta aquela recompensa no
céu que será na proporção de nossa santidade na terra.
3.
Em Terceiro Lugar, nós podemos reunir, da maneira do Apóstolo falar,
que, mesmo a opressão, não é sempre necessária. 'Agora, por um tempo, se
preciso'; De modo que nem é necessária a todas as pessoas; nem para alguma
pessoa todo o tempo. Deus é capaz; Ele tem poder e sabedoria para operar,
quando lhe agradar, a mesma obra da graça, em alguma alma, por outros meios. E,
em algumas instâncias, Ele faz assim; Ele faz com que esses, a quem Ele se
agrada de seguir adiante, de força em força, até mesmo fazendo com que eles 'aperfeiçoem
a santidade em seu medo'; raramente com alguma opressão, afinal; como tendo
um poder absoluto sobre o coração do homem, e movendo todas as fontes dele como
lhe agrada. Mas esses casos são raros: Deus geralmente acha bom testar 'os
homens aceitáveis na fornalha de aflições'. De modo que aquelas múltiplas
tentações e opressão são, mais ou menos, usualmente a porção de seus filhos
mais queridos.
4.
Para concluir, nós devemos, portanto, vigiar e orar; e usarmos de nossos mais
extremos esforços, para evitarmos cair na escuridão. Mas não precisamos estar
apreensivos, em como evitarmos, tanto quanto, em como melhorarmos, através da
opressão. Nosso
grande cuidado deve ser, então, nos comportarmos sob ela; esperarmos junto ao
Senhor, para que ela possa responder completamente a todo o desígnio de Seu
amor; permitindo que ela venha sobre nós; e que ela possa ser os meios de
aumentar nossa fé; de confirmar nossa esperança; de aperfeiçoar-nos em toda
santidade. Quando quer que ela venha, que tenhamos um olho para essas
finalidades graciosas, para as quais ela é permitida; e usemos de toda a
diligência que pudermos, para que não tornemos sem efeito o conselho de Deus a
nós mesmos. Vamos, sinceramente, trabalhar junto com ela, através da graça que
Ele continuamente nos dá; 'purificando a nós mesmos da poluição da carne e
espírito'; e diariamente crescendo na graça de nosso Senhor Jesus Cristo,
até que sejamos recebidos em seu reino eterno!
[Editado por
Tim Dawson, estudante da Northwest Nazarene College (Nampa, ID), com correções
por George Lyons para a Wesley Center for Applied Theology.]