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quinta-feira, 16 de abril de 2020

A Lei Estabelecida Através da Fé – Parte I



John Wesley

'Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma, antes estabelecemos a lei'. (Romanos 3:31)

I. Quais os meios mais usuais de 'tornar a lei, sem efeito, através da fé?

II. Como podemos seguir o Apóstolo, e pela fé 'estabelecer a lei'.

III. Nós podemos tornar a lei sem efeito, na prática, vivendo como se a fé fosse designada para nos isentar da santidade.

1. No início da Epístola de Paulo, ele escreveu sua proposição geral, ou seja, a de que 'o Evangelho de Cristo é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê'; – os meios poderosos, por meio dos quais, Deus torna cada um que crê um parceiro da salvação eterna e presente; -- mostrando que não existe outro caminho debaixo do céu, pelo que os homens possam ser salvos. Ele fala, particularmente da salvação da culpa do pecado, que ele comumente denomina justificação. Ele prova com vários argumentos, endereçados aos judeus, assim como aos pagãos, que todos os homens têm necessidade disto; que ninguém pode advogar a sua própria inocência. Disto, ele infere (no 19o verso deste capítulo) que 'toda boca', quer de judeus ou ateus, deve ser 'fechada', de desculpar-se ou justificar a si mesma; 'e que todo o mundo tornou-se culpado, diante de Deus'. 'Portanto', ele diz, pela sua própria obediência, 'pelas palavras da lei, nenhuma carne será justificada, diante Dele'. 'Mas, agora, a retidão de Deus, sem a lei', -- sem nossa obediência prévia a esta, -- 'é manifestada'; 'até mesmo a retidão de Deus, que, pela fé em Jesus Cristo, junto a todos, e para todos os que crêem': 'Porque não existe diferença', -- já que a necessidade deles da justificação, ou da maneira, como eles a obtêm; -- 'a imagem gloriosa de Deus, por meio da qual eles foram criados; e todos' (que a obtiveram) 'são justificados livremente, pela sua graça, através da redenção que está em Jesus Cristo, a quem Deus enviou para a expiação, através da fé em seu sangue; para que Ele possa ser justo, e também o justificador daquele que acredita em Jesus; -- 'sem qualquer impedimento para sua justiça; já que Ele mostraria misericórdia por causa da conciliação. 'Portanto, nós concluímos', (o que foi a grande posição que ele empreendeu estabelecer), 'que um homem é justificado pela fé, sem as obras da lei'. (Verso: 20-28).

2. Foi fácil, prever a objeção que poderia ser feita, e que existiu de fato, em todas as épocas; ou seja, dizer que somos justificados, sem as obras da lei, é abolir a lei. O Apóstolo, sem entrar em uma disputa formal, simplesmente nega a instrução. 'Nós, então', pergunta ele 'tornamos sem efeito a lei através da fé? Deus proíbe! Sim, nós estabelecemos a lei!'.

3. A estranha imaginação de alguns, de que Paulo, quando disse, 'um homem é justificado sem as obra da lei', significa apenas a lei cerimonial, é abundantemente confundida por essas mesmas palavras. Afinal, Paulo estabeleceu a lei cerimonial? É evidente, que não. Ele tornou a lei nula, através da fé, e, abertamente, declarou estar fazendo isso. Tratou-se apenas da lei moral, da qual ele poderia verdadeiramente dizer: nós não tornamos a lei nula, mas a estabelecemos, através da fé.
4. Mas nem todos os homens concordam com o que ele pensa. Muitos não aceitam. Muitos em todas as épocas da Igreja, até mesmo, aqueles que carregam o nome de cristãos têm defendido que 'a fé uma vez entregue aos santos' teve como objetivo tornar toda a lei nula.  Eles não tomariam em consideração a lei moral mais do que a lei cerimonial, mas foi para 'rachar', por assim dizer, 'ambas em pedaços diante do Senhor'; veementemente afirmando que, 'se você estabelecer qualquer lei, Cristo não o favorecerá em coisa alguma; Cristo se torna sem efeito para você; você caiu da graça'.

5. Mas o zelo desses homens está de acordo com o conhecimento? Eles observaram a conexão entre a lei e a fé? E que, estabelecendo essa conexão entre eles, destruir uma, na verdade, significa destruir a ambas? – que abolir a lei moral, é, portanto, abolir a fé e a lei? Não nos deixando um meio apropriado, quer para nos levar até a fé, ou para encorajar aquele dom de Deus em nossa alma?

6. Portanto, convém a todos que desejam vir para Cristo, a quem eles receberam, assim como caminhar Nele, prestar atenção em como eles 'tornaram a lei nula, através da fé. Para nos proteger efetivamente, contra ela, nos permita inquirir, Em Primeiro Lugar, quais são os caminhos mais usuais para tornar 'a lei nula, através da fé?' E, Em Segundo Lugar, como nós podemos seguir o Apóstolo, e pela fé, 'estabelecer a lei'.

I

1. Em Primeiro Lugar, vamos inquirir: Quais são os caminhos mais usuais de tornar a lei nula, através da fé? Porque a maneira de um pregador tornar tudo nulo, de um só golpe, é não pregar nada a respeito, afinal. Isto será justamente a mesma coisa que apagar os oráculos de Deus. Mais especialmente, quando isto é feito com um objetivo; quando é feito como uma regra, não pregue a lei, e a mesma frase, 'Um pregador da Lei', é usada como um termo de reprovação, como se significasse pouco menos do que um inimigo do Evangelho.

2. Tudo isto procede da mais profunda ignorância da natureza, propriedades e uso da lei; e prova que aqueles que agem assim, não conhecem Cristo, -- são totalmente estranhos à fé viva, -- ou, pelo menos, eles são bebês em Cristo, e, como tais, 'inexperiente na palavra da retidão'.

3. O argumento deles é este: Que pregando o Evangelho, ou seja, de acordo com o julgamento deles, falar em nada mais que dos méritos de Cristo, responde à todas as finalidades da lei. Mas isto nós negamos completamente, ou seja, convencer os homens do pecado; o despertar aqueles que ainda estão dormindo à margem do inferno. Pode haver aqui e ali algum caso isento. Um em mil, pode ter sido acordado pelo Evangelho: Mas isto não é regra geral: O método comum de Deus é convencer os pecadores, através da lei, e apenas por meio desta. O Evangelho não é o meio pelo qual Deus tem ordenado, ou que o próprio Senhor usou, para esta finalidade. Nós não temos autoridade nas Escrituras para aplicar isto assim; nem qualquer alicerce para pensar que isto irá se provar efetivo. Nem temos algum alicerce a mais para esperar isto, da natureza da coisa. 'Aqueles que estão sadios', como observa o próprio nosso Senhor, 'não precisam de um medido, mas aqueles que estão doentes'. É um absurdo, portanto, se oferecer um medico àqueles que estão sadios, ou que, pelo menos, imaginam-se assim. Você deverá, primeiro, convencê-los de que estão doentes; do contrário, eles não irão agradecer pelo seu empenho. Igualmente absurdo é oferecer Cristo àqueles cujo coração está sadio, e ainda não está enfraquecido. Neste mesmo sentido, é como 'atirar pérolas aos porcos'. Sem dúvida, 'eles irão pisoteá-las', e isto é nada mais do que você ter motivos para esperar que eles também 'possam se voltar contra você e despedaça-lo'.

4. 'Mas, embora não exista uma ordem nas Escrituras, oferecendo Cristo para o pecador desamparado, ainda assim, não existem precedentes bíblicos para isto?'. Eu penso que não: Eu não conheço coisa alguma a respeito. Eu acredito que você não pode conseguir algum, quer dos Evangelhos, ou dos Atos dos Apóstolos. Nem você poderá provar que esta tem sido a prática de alguns dos Apóstolos, em qualquer uma das passagens em todos os seus escritos.

5. Mais do que isto, o Apóstolo Paulo não diz em suas primeiras Epístolas aos Coríntios, 'Nós pregamos Cristo crucificado?' (1:23), e em sua última, 'Nós não pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o Senhor?' (4:5).

Nós admitimos ao restante a causa dessa discussão; trilhar seus passos, seguir seu exemplo. Mas apenas pregue, exatamente como Paulo pregou, e o debate chega ao fim.

            Porque, embora estejamos certos de que ele pregou Cristo de maneira tão perfeita, como cabe ao principal chefe dos Apóstolos, ainda assim, quem pregou a lei mais do que Paulo? Portanto, ele não pensava que o Evangelho respondia à mesma finalidade.

6. Mesmo o primeiro sermão de Paulo conclui nestas palavras: "Através dele todos os que crêem são justificados em todas as coisas, de maneira que não podemos ser justificados pela lei de Moisés. Cuidem, portanto, a fim de que não venha sobre vocês o que foi falado dos Profetas: 'Vede, ó desprezadores, e espantai-vos e desaparecei; porque opero uma obra em vossos dias; obra tal que não crereis, se alguém vo-la contar'". (Atos 13:39-40) Agora, é declarado que tudo isto é pregar a lei, no sentido em que vocês entendem o termo; mesmo que grande parte dele, se não toda, seus ouvintes, fossem tanto judeus, ou prosélitos religiosos e, portanto, provavelmente muitos deles, em algum grau, pelo menos, já condenados pelo pecado. Ele primeiro lembra a eles que eles não serão justificados pela Lei de Moisés, mas apenas pela fé em Cristo; e, então, severamente intimidá-los com os julgamentos de Deus, que está no sentido mais forte, pregando a lei.

7. Em seu discurso seguinte, aquele para os ateus em Listra (Atos 14:15 em diante), nós não encontramos tanto mais que o nome de Cristo: Todo o teor dele é que eles pudessem 'abandonar aqueles ídolos vãos, e voltassem para o Deus vivo'. Agora, confessem a verdade: vocês acreditam que se vocês estivessem lá, vocês teriam pregado muito melhor do que ele? Eu não me surpreenderia, se vocês pensassem também que a pregação dele, de tão imprópria, justificou ele ter sido tão maltratado; e que o fato de ter sido apedrejado, foi um julgamento justo que ele recebeu por não pregar a Cristo!

8. Para o carcereiro, de fato, quando ele "entrou na sela onde Paulo e Silas estavam, e tremendo, caiu diante deles, dizendo: 'senhores, o que mais preciso fazer para ser salvo?'", eles imediatamente disseram: 'Creia no Senhor Jesus Cristo' (Atos 16:29-30); mas, no caso de alguém tão profundamente convencido do pecado, quem não teria dito o mesmo? Não obstante, aos homens de Atenas, vocês o encontram falando de uma maneira completamente diferente – reprovando a superstição, ignorância, e idolatria; e firmemente levando-os para o arrependimento, por conta do julgamento futuro e da ressurreição dos mortos. (Atos 17:24-31) "Porquanto tem determinado um dia em que com justiça há de julgar o mundo, por meio do homem que destinou; e disso deu certeza a todos, ressuscitando-o dentre os mortos". Igualmente, quando Felix foi mandado a Paulo, com o propósito de que ele pudesse 'ouvi-lo, concernente à fé em Cristo'; em vez de pregar Cristo em seu sentido (o que provavelmente teria feito o Governador tanto zombar, quanto contradizer, ou blasfemar), 'ele falou da justiça, temperança, e julgamento que viria', até que Felix (insensível como era), 'tremeu' (24:24-25). Vão. Trilhem os passos de Jesus. Preguem Cristo para o pecador desamparado, raciocinando sobre a 'justiça, temperança, e o julgamento que virá!'.

9. Se você disser: 'Mas ele pregou Cristo de diferentes maneiras em suas Epístolas': Eu respondo:

(1)            Ele não pregou lá, afinal; não no sentido em que falamos: porque, pregar, em nossa presente questão, significa falar diante de uma congregação. Mas acenando a isto, eu respondo:
(2)            Suas Epístolas são dirigidas, não para os não-crentes, tais como aqueles dos quais estamos falando, mas 'para os santos de Deus', em Roma, Corinto, Felipe, e outros lugares. Agora, sem dúvida, ele falaria mais de Cristo a esses do que àqueles que estavam sem Deus no mundo.
(3)            E, ainda assim, cada uma dessas, está cheia da lei, até mesmo, as Epístolas aos Romanos e aos Gálatas; nas quais ele faz o que ele denomina 'pregar a lei', e isto para os crentes, assim como para os não-crentes.

10. Disto tudo, fica claro que vocês não sabem o que é pregar Cristo, no sentido do Apóstolo. Porque, indubitavelmente, Paulo julgou que pregava Cristo, tanto para Felix, quanto em Antioquia, Listra e Atenas: de quais exemplos, todo homem de discernimento deve inferir, que não apenas declarando o amor de Cristo aos pecadores, mas também, declarando que ele virá dos céus em fogo, é, no sentido do Apóstolo, pregar a Cristo; e no sentido bíblico completo da palavra. Pregar a Cristo é pregar o que ele tem revelado no Velho ou no Novo Testamento, de modo que você está realmente pregando a Cristo, quando você está dizendo: 'o ímpio deverá ir para o inferno, e todo o povo que se esquecer de Deus'; da mesma forma, quando você diz: 'observem o Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo!'.  

11. Considere isto bem: -- que pregar Cristo, é pregar todas as coisas que Cristo tem falado; todas as suas promessas; todas as suas advertências, e comandos; tudo que está escrito em seu livro; e, então, você irá saber como pregar Cristo, sem tornar a lei nula.

12. 'Mas bênçãos maiores não atendem os discursos em que nós particularmente pregamos os méritos e sofrimento de Cristo?'.

            Provavelmente, quando nós pregamos para a congregação de murmuradores, ou de crentes, esses serão atendidos com bênçãos maiores; porque tais discursos são peculiarmente adequados ao seu estado. Pelo menos, esses irão transmitir usualmente maior conforto. Mas esta não será sempre a bênção maior. Eu poderei, algumas vezes, receber uma muito maior, através de um discurso que me dilacere o coração e me reduza ao pó. Eu não receberia este conforto, nem mesmo, se eu pregasse ou ouvisse algum discurso, a não ser sobre os sofrimentos de Cristo. Esses, através de constantes repetições, perderiam sua força, e se tornariam mais e mais vazios e mortos, até que, por fim, eles se tornariam inertes ao redor das palavras, sem qualquer espírito, vida, ou virtude. De modo que pregar a Cristo deve, no processo de tempo, tornar o Evangelho nulo, assim como a lei.

II

1. Uma outra maneira de tornar a lei nula, através da fé, é ensinar a fé, que substitui a necessidade de santidade. Isto a divide, em milhares de caminhos menores, e muitos são os que caminham nele. Na verdade, existem poucos que escapam totalmente dele; poucos que são convencidos de que somos salvos pela fé, a não ser que, mais cedo ou mais tarde, mais ou menos, deixemos de lado este caminho secundário.

2. Se todos esses que são levados para este caminho secundário não se conscientizarem de que a fé em Cristo coloca inteiramente de lado a necessidade de manter a lei; ainda assim, suporem a necessidade de manter a fé deles de lado; ainda assim, suporem: (1) que a santidade é menos necessária agora do que ela foi antes da vinda de Cristo; (2) que um grau menor dela é necessário; (3) que ela é menos necessária aos crentes do que aos outros. Porque assim são todos aqueles que, embora o julgamento deles esteja, em geral, correto, ainda assim, pensam que eles podem ter mais liberdade, em casos específicos, do que eles poderiam ter tido antes que cressem; de fato, usarem o termo liberdade, de tal maneira, como estando livres da obediência ou santidade mostra, imediatamente, que o julgamento deles está pervertido, e que eles são culpados do que eles imaginaram estar muito longe deles; ou seja, de tornarem a lei nula, através da fé, por suporem que a fé substitui a santidade. 

3. O primeiro argumento daqueles que ensinam isto, expressivamente é que nós estamos debaixo da promessa da graça, não das obras; e, portanto, nós não mais precisamos estar debaixo da necessidade de executar as obras da lei.

            E quem, alguma vez, esteve debaixo da promessa das obras? Ninguém, a não ser Adão, antes da queda. Ele esteve completamente e apropriadamente debaixo da aliança que requereu perfeição, obediência universal, como a única condição de aceitação; e não deixava lugar para o perdão, quando da menor transgressão. Mas nenhum homem, alguma vez, esteve debaixo disto, nem os judeus ou gentios; nem antes de Cristo, nem desde então. Todos os seus filhos estavam e estão debaixo da aliança da graça. A maneira da aceitação deles é esta: A livre graça de Deus, através dos méritos de Cristo, perdoa a todos que crêem; que crêem com tal fé, que, operada pelo amor, produz toda obediência e santidade.

4. O caso não é, portanto, como vocês supõem, que os homens foram, alguma vez, mais obrigados a obedecer a Deus, ou a executar as obras da Sua lei, do que eles são agora. Mas nós poderíamos ter sido obrigados, se nós estivéssemos debaixo da aliança das obras; se tivéssemos realizado essas obras antes da nossa aceitação.  Considerando que agora todas as boas obras, embora tão necessárias como sempre, não são anteriores à nossa aceitação, mas conseqüentes a ela. Portanto, a natureza da aliança da graça não dá a vocês fundamento; nenhum encorajamento, afinal, para colocarem de lado qualquer insistência ou grau de obediência; nenhuma parte ou medida de santidade.

5. 'Mas nós não somos justificados pela fé, sem as obras da lei?'. Sem dúvida, que somos; sem as obras, quer da lei cerimonial ou moral. E, por Deus, todos os homens estivessem convencidos disto! Com certeza, iria impedir inumeráveis males; o Antinomianismo [Doutrina de que, pela fé e a graça de Deus anunciadas no Evangelho, os cristãos são libertados não só da lei de Moisés, mas de todo o legalismo e padrões morais de qualquer cultura], em particular. Porque, falando de uma maneira geral, foram os fariseus que se transformaram nos antinomianos. Seguindo a um extremo tão palpavelmente contrário às Escrituras, eles fizeram com que outros seguissem para o lado oposto. Estes, buscando serem justificados pelas obras, aterrorizaram aqueles por permitirem algum espaço para eles.

6. Mas a verdade se coloca entre ambos. Nós somos, sem dúvida, justificados pela fé. Este é a pedra angular de toda construção cristã. Nós somos justificados, sem as obras da lei, como uma condição prévia da justificação; mas elas são os frutos imediatos daquela fé, por meio da qual somos justificados. De modo que, se as boas obras não vêm em seguida à nossa fé, até mesmo toda santidade interior e exterior, é claro que nossa não vale nada; nós ainda estamos em nossos pecados. Portanto, já que somos justificados pela fé, até mesmo por nossa fé, sem as obras, não existe fundamento para tornar a lei nula através da fé; ou para imaginar que a fé é uma dispensação de algum tipo ou grau de santidade.

7. "Mais do que isto, Paulo não disse expressamente, 'Aquele que não realiza, mas crê Nele, que justifica o impuro, sua fé é contada como retidão?'. E não se conclui disto que a fé está, para o crente, no lugar da retidão? Mas, se a fé está no lugar da retidão ou da santidade, qual a necessidade que existe desta também?"

            Isto - se deve reconhecer - chega ao ponto, e é, de fato, o principal pilar do Antinomianismo. E ainda assim, não precisa de uma resposta longa e elaborada. Nós admitimos (1) que Deus justifica o impuro; aquele que, até aquele momento, está totalmente impuro; -- cheio de toda maldade, nulo de todo bem; (2) que Ele justifica o impuro que não realiza as boas obras; que, até aquele momento, não as praticou; -- nem poderia, porque de uma árvore má não se colhe bons frutos; (3) que Ele justifica a ele, pela fé somente, sem qualquer santidade ou retidão precedente; e (4) que a fé e, então, considerada como retidão, ou seja, por preceder a retidão; quer dizer, Deus, através dos méritos de Cristo, aceita aquele que crê, como se ele já tivesse cumprido toda retidão. Mas o que é tudo isto para o seu ponto? O Apóstolo não disse, quer aqui, ou em qualquer outro lugar, que esta fé é contada para ele, por retidão subseqüente. Ele ensina que não existe retidão antes da fé; mas onde ele ensina que existe nenhuma depois dela? Ele afirma que a santidade não produz santificação; mas não que ela não precisa segui-la. Paulo, portanto, dá a vocês, nenhuma razão para tornar a lei nula, por ensinar que a fé substitui a necessidade da santidade.

III

1. Existe um outro modo de tornar a lei nula, através da fé que é mais comum do que, até mesmo, a anterior. E que é fazê-lo na prática; torná-la nula de fato, embora que não em princípio; vivendo como se a fé fosse designada para isentar-nos da santidade.

            Quão honestamente o Apóstolo nos alerta contra isto, naquelas renomadas palavras: 'Pois que? Pecaremos, porque não estamos debaixo da lei, mas debaixo da graça? De modo algum'. (Romanos 6:15) Uma advertência, que é necessário considerar totalmente, porque é de extrema importância.

2. O estar 'debaixo da lei', pode aqui significar: (1) estar obrigado a observar o cerimonial da lei; (2) estar obrigado a aceitar toda a instituição mosaica; (3) estar obrigado a manter toda a lei moral, como a condição de nossa aceitação por parte de Deus; e (4) estar debaixo da ira e maldição de Deus; debaixo da sentença da morte eterna; debaixo do sentido de culpa e condenação; cheio de horror e temor escravizante.

3. Agora, embora um crente 'não esteja sem lei para Deus, mas esteja debaixo da lei de Cristo', ainda assim, do momento em que ele crê, ele 'não está debaixo da lei', em qualquer um dos sentidos precedentes. Do contrário, ele está 'debaixo da graça'; debaixo de uma dispensação mais benigna e graciosa. Uma vez que ele não mais está debaixo da lei cerimonial; nem debaixo da instituição mosaica; uma vez que ele não é obrigado a manter, nem mesmo a lei moral, como uma condição de sua aceitação; então, ele está livre da ira e da maldição de Deus; de todos os sentidos de culpa e condenação; e de todo aquele horror e temor da morte e inferno, por meio dos quais ele esteve toda sua vida, quando da escravidão. Agora ele pode executar (o que, 'debaixo da lei' ele não podia) a obediência desejada e universal. Ele não obedece mais por causa do temor escravo, mas por um princípio mais nobre, ou seja, a graça de Deus, dominando seu coração e fazendo com que suas obras sejam forjadas no amor.

4. Será que esse princípio evangélico é menos poderoso do que o legal? Será que nós somos menos obedientes a Deus, através do amor filial, do que quando tínhamos medo servil? 

Seria bom, se este não fosse um caso comum; se este Antinomianismo prático; este caminho desapercebido de tornar a lei nula, não tivesse infectado milhares de crentes.

            Ele ainda não infectou vocês? Examinem-se honesta e minuciosamente. Vocês não fazem agora o que vocês não ousariam ter feito, quando vocês estavam 'debaixo da lei'; ou (como nós comumente denominamos) debaixo da convicção? Por exemplo: Vocês não se atreveram viciar-se em alimento: Vocês fizeram uso apenas do que era necessário, e de um tipo menos dispendioso? Vocês não se permitem mais liberdade agora? Vocês não favorecem a si mesmo um pouco mais do que antes? Oh! Cuidem, a fim de que vocês 'não pequem, porque não estão debaixo da lei, mas porque estão debaixo da graça!'.

5. Quando vocês estavam debaixo da convicção, vocês não se atreveram a favorecer a luxúria dos olhos em qualquer que fosse o grau. Vocês não fariam coisa alguma, grande ou pequena, meramente para gratificar a curiosidade. Vocês cuidariam apenas da limpeza e necessidade, ou, no máximo, de uma conveniência moderada, tanto no mobiliário, quanto na vestimenta; superficialidade e ornamentos de qualquer tipo, assim como andarem na moda, tudo isto era um terror e uma abominação para vocês.

            Vocês são assim ainda? A consciência de vocês é tão cuidadosa agora com essas coisas, como ela era até então? Vocês ainda seguem a mesma regra no mobiliário, e no vestuário, desprezando toda ostentação, toda superficialidade, todas as coisas inúteis, todas as coisas meramente ornamentais, por mais que estejam na moda? Antes, vocês não têm recuperado o que vocês, uma vez, deixaram de lado; e o que vocês não poderiam, até então, fazer uso, sem perturbar suas consciências? E vocês não aprenderam a dizer: 'Ó, eu não sou tão escrupuloso agora?'. Em Deus que assim fosse! Porque então, vocês não pecariam; 'não porque vocês não estão debaixo da lei, mas porque estão debaixo da graça!'.

6. Uma vez, vocês foram escrupulosos também de enaltecerem alguém na presença dele; e ainda mais, de permitirem que alguém elogiasse vocês. Isto era como um golpe no coração de vocês; vocês não podiam suportar; porque vocês buscavam a honra que vem de Deus apenas. Vocês não podiam tolerar tal conversa; nem qualquer conversa que não fosse boa para o uso da edificação. Toda conversa inútil, todo discurso leviano, vocês abominavam; vocês odiavam, assim como temiam isto; estando profundamente conscientes do valor do tempo, de cada momento precioso e passageiro. De igual maneira, vocês temiam e abominavam os gastos desnecessários; valorizando seu dinheiro apenas menos do que seu tempo, e preocupados a fim de que vocês não fossem considerados mordomos infiéis, até mesmo, da riqueza maléfica da iniqüidade.

Vocês agora menosprezam o louvor como veneno mortal, o qual vocês nem pode dar, nem podem receber, a não ser na pureza de suas almas? Vocês ainda temem e abominam toda conversa que não tenda ao uso da edificação; e trabalham para melhorar cada momento, para que ele não possa passar sem torná-los melhores do que ele encontrou vocês? Vocês estão menos cuidadosos quanto ao gasto ambos do dinheiro e do tempo? Vocês agora não podem dispor de ambos, como vocês não poderiam fazer outrora? Ai de mim! Como aquilo que poderia ter sido para a saúde, provou ser para vocês uma chance de queda! Como vocês puderam 'pecar, não porque vocês não estavam sob a lei, mas porque vocês estavam sob a graça?'.

7. Deus proíbe que vocês possam continuar desse jeito, e 'transformar a graça de Deus em lascívia!'. Lembrem-se quão clara e forte convicção vocês tiveram, no que diz respeito a todas essas coisas! E, ao mesmo tempo, vocês estavam completamente satisfeitos com aquele de onde procedeu aquela convicção. A Palavra disse a vocês que vocês estavam iludidos; mas vocês sabiam que se tratava da voz de Deus. Nessas coisas vocês não eram tão escrupulosos, então; mas agora vocês não são escrupulosos o suficiente. Deus manteve vocês mais tempo naquela escola dolorosa; para que vocês pudessem aprender aquelas grandes lições mais perfeitamente. E vocês já se esqueceram delas? Oh! Reúna-as antes que seja muito tarde! Vocês já não sofreram muitas coisas em vão? Eu confio que ainda não foi em vão. Agora usem a convicção, sem a dor! Pratiquem a lição, sem o castigo! Não deixem que a misericórdia de Deus pese menos para vocês agora, do que sua indignação veemente fez anteriormente. O amor é uma razão menos poderosa do que o medo? Se não, que seja uma regra imutável, "Eu nada farei agora que estou 'debaixo da graça', que eu não me atrevi fazer, quando estava 'debaixo da lei'".

8. Eu não posso concluir este assunto, sem exortá-los a examinarem a si mesmos, igualmente, no tocante aos pecados da omissão. Vocês estão tão certos destes, agora que vocês 'estão debaixo da graça', quanto quando estavam 'debaixo da lei?'. Quão diligentes vocês foram, então, ao ouvirem a Palavra de Deus! Vocês negligenciaram alguma oportunidade? Vocês não atenderam [à Igreja] depois disto dia e noite? Um pequeno obstáculo teria mantido vocês de fora? Uma pequena ocupação? Um visitante? Uma indisposição passageira? Uma cama macia? Uma manhã escura e fria? – Vocês, então, não jejuaram, freqüentemente; ou usaram de abstinência ao extremo do poder de vocês? Vocês não oraram muito (frios e pesados como vocês estavam), enquanto vocês estavam dependurados na boca do inferno? Vocês não falaram e não trataram com indulgência, até mesmo, por causa de um Deus desconhecido? Vocês não defenderam a causa Dele corajosamente? — vocês não reprovaram os pecadores? – e declararam francamente a verdade diante da geração adúltera? E agora vocês são crentes em Cristo? Vocês têm a fé que ultrapassa todo entendimento? O que? E são menos zelosos pela causa de seu Mestre agora, do que foram quando vocês não o conheciam? Menos diligentes no jejuarem, no orarem, no ouvirem Sua Palavra, no chamarem os pecadores para Deus? Oh! Arrependam-se! Vejam e sintam sua perda grave! Lembrem-se de onde vocês caíram! Lamentem a infidelidade de vocês! Agora sejam zelosos, e façam as primeiras obras; caso contrário, se vocês continuarem a 'tornar a lei nula, através da fé', Deus os expulsará, e designará vocês para sua porção com os descrentes!

[Editado por Josh Williams, estudante da Northwest Nazarene College (Nampa, ID), com correções de George Lyons para a Wesley Center for Applied Theology.]


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