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quarta-feira, 15 de julho de 2020

O Novo Nascimento


John Wesley

"Não te admires de eu te dizer: importa-vos nascer de novo" (João 3:7)
  
1. Se alguma doutrina, dentro de toda a extensão do Cristianismo, pode ser propriamente denominada fundamental, essas duas, sem dúvida são elas: a doutrina da justificação, e aquela do novo nascimento. A primeira relativa àquele grande trabalho o qual Deus operou por nós, perdoando nossos pecados; a última, ao grande trabalho que Deus operou em nós, renovando nossa natureza caída. Na ordem do tempo, nenhuma delas é colocada antes da outra: No momento em que nós estamos justificados, pela graça de Deus, através da redenção que está em Jesus, nós somos também "nascidos do Espírito", mas, em ordem de pensamento, como está denominada, justificação precede o novo nascimento. Nós, primeiro, temos em mente, sua ira sendo desviada, e, então, seu Espírito operando em nossos corações. 

2. De quão grande importância, então, deve ser para todos os filhos do homem, entenderem completamente essas doutrinas fundamentais! Da total convicção disso, muitos homens excelentes têm escrito bastante largamente a respeito da justificação, explicando cada ponto relativo a ela, e abrindo as Escrituras que tratam a esse respeito. Muitos, igualmente, têm escrito sobre o novo nascimento: E alguns deles, largamente suficiente; mas, ainda assim, não tão claramente como poderia ser desejado; nem tão profundamente ou corretamente; tendo dado um relato obscuro, e de difícil compreensão, assim como, insignificante e superficial. Entretanto, um completo, e, ao mesmo tempo, claro relato do novo nascimento parece ser ainda esperado; de tal maneira, que possa ser capaz de nos dar uma resposta satisfatória a essas três questões:

I.                          Por que nós devemos nascer de novo? Qual o fundamento da doutrina do novo nascimento?
II.                       Como nós devemos nascer de novo? Qual a natureza do novo nascimento?
III.                    Para que nós devemos nascer novamente? Para que finalidade ele é necessário?
IV.                    Essas questões, pela assistência de Deus, eu devo, responder, brevemente e plenamente; e, então, acrescentar algumas poucas inferências as quais naturalmente se seguem:

I
  
(1) Por que nós devemos nascer de novo? Qual o fundamento dessa doutrina?
           
O alicerce dela é tão remoto quanto a criação do mundo; num relato bíblico, a respeito do que nós lemos: (Gen. 1:26,27) "Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar; sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que rastejam pela terra. Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou". — Não somente, em sua imagem natural,  um retrato de sua própria imortalidade; uma existência espiritual, Doda com entendimento, liberdade de vontade,e afecções várias; — não meramente em sua imagem política, de governador desse mundo aqui de baixo, tendo "domínio sobre os peixes do mar, e sobre toda a terra"; — mas, principalmente, em sua imagem moral; que, de acordo com o Apóstolo, em (Efésios 4:24) "E vos revistais do novo homem, criado segundo Deus, em justiça e retidão precedentes da verdade". Nessa imagem de Deus o homem foi feito. "Deus é amor". Por conseguinte, o homem de sua criação era cheio de amor; que era o princípio único de todo seu temperamento, pensamentos, palavras e ações. Deus é cheio de justiça, misericórdia, e verdade; de modo que assim era o homem, quando ele veio das mãos de seu Criador.

Deus é imaculadamente puro; e assim o homem era, no início; puro de toda mancha de pecado; do contrário, Deus não o teria pronunciado, tanto quanto toda obra de suas mãos, "bem feita" (Gen. 1:31) "Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom". Isto ele não seria, se ele não estivesse puro do pecado, e cheio com a retidão e a santidade verdadeira. Porque não existe meio termo: se nós supomos uma criatura inteligente que não ame a Deus, que não seja reta e santa, nós necessariamente supomos que, afinal, não seja uma boa pessoa; muito menos, que seja "muito boa".

(2) Mas, embora o homem tenha sido feito a imagem de Deus, ainda assim, ele não foi feito imutável.

Isso teria sido inconsistente com o estado de experimentação, na qual Deus estava satisfeito de situá-lo. Ele foi, entretanto, criado capaz de permanecer nele, e ainda sujeito a cair. E isso o próprio Deus o notificou a respeito, e deu a ele um aviso solene contra. Contudo, o homem não subsistiu na honra: Ele caiu do seu alto posto. Ele "comeu da árvore que o Senhor tinha ordenado a ele que não comesse". Por esse ato proposital de desobediência ao seu Criador, essa rebelião clara contra o Todo-Poderoso, ele declarou abertamente que não poderia ter as regras de Deus sobre ele, por muito tempo. Que ele seria governado por sua própria vontade, e não a vontade Dele que o criou; e que ele não buscaria sua felicidade em Deus, mas no mundo, no trabalho de suas mãos. Agora, Deus disse a ele: "No dia em que comeres" daquele fruto, "tu certamente morrerás". E a palavra do Senhor não pode ser quebrada. Por conseguinte, naquele dia, ele morreu: ele morreu para Deus, — a mais terrível das mortes. Ele perdeu a vida de Deus. Ele foi separado Dele, em cuja união sua vida espiritual consiste.

O corpo morre, quando ele é separado da alma; a alma, quando ela é separada de Deus. Mas essa separação de Deus, Adão manteve nesse dia, no momento em que ele comeu do fruto proibido. E disso, ele deu prova imediata; presentemente, mostrando, por seu comportamento, que o amor de Deus fora extinguido em sua alma, e que agora era "alienado da vida de Deus".  Em vez disso, ele estava debaixo do poder servil do medo, de modo que ele fugia da presença do Senhor. Sim, tão pouco ele reteve, até mesmo, do conhecimento Dele que encheu os céus e a terra, que ele se esforçou para "esconder a si mesmo do Senhor Deus, entre as árvores do Jardim". (Gen. 3:8). Assim sendo, ele perdeu tanto o conhecimento quanto o amor de Deus, sem o que a imagem de Deus não poderia subsistir. Disso, entretanto, ele foi despojado, no mesmo instante, e tornou-se impuro e infeliz. Nessa oportunidade, ele afundou no orgulho e vontade própria, a mesma imagem do diabo; e nos apetites sexuais e desejos; a imagem das bestas que perecem. 

(3) Se tivesse sido feita apenas uma ameaça, 'no dia em que comeres dele, tu certamente morrerás', referindo à morte temporal; apenas essa; à morte do corpo, tão somente", a resposta seria clara: afirmar isso é positivamente  e palpavelmente fazer de Deus um mentiroso; asseverar que o Deus da verdade positivamente afirmou o contrário da verdade. Porque é evidente que Adão não morreu nesse sentido, "no dia em que ele comeu do fruto". Ele viveu, ao contrário, novecentos anos mais. De maneira que isso não poderia ser possivelmente entendido como a morte do corpo, sem contestar a veracidade de Deus. Isto deve ser entendido, no entanto, como a morte espiritual; a perda da vida e imagem de Deus.

(4) E, em Adão, todos morreram; toda a espécie humana; todos os filhos dos homens estavam, então, na força motriz de Adão. A conseqüência natural disso é que cada um dos descendentes dele veio para o mundo, espiritualmente morto; morto para Deus; totalmente morto no pecado; inteiramente vazio da vida de Deus; vazio da imagem de Deus, de toda retidão e santidade, na qual, Adão foi criado. Em vez disso, todo homem nascido no mundo carrega agora a imagem do diabo, no orgulho e amor-próprio; a imagem da besta, nos apetites sexuais e desejos. Isso, então, é o fundamento do novo nascimento —, a corrupção total de nossa natureza. Assim sendo, que, tendo nascido no pecado, nós devemos "nascer novamente". Conseqüentemente, cada um que é nascido de uma mulher deve ser nascido do Espírito de Deus.  

II

(1) Mas, quanto é necessário que um homem nasça de novo? Qual a natureza do novo nascimento?

Essa é a segunda pergunta. E é uma questão, no momento mais importante que pode ser concebida. Nós não devemos, entretanto, num assunto tão grave, nos contentar com uma inquisição insignificante; mas examiná-la, com todo o cuidado possível, e ponderá-la, em nossos corações, até que entendamos completamente esse ponto importante, e vejamos claramente como nós devemos nascer novamente.

(2) Nem devemos esperar, em momento algum, um relato filosófico da maneira como isso é feito. Nosso Senhor nos guardou suficientemente contra tal expectativa, pelas palavras que se seguem imediatamente ao texto; onde ele lembra Nicodemos do fato tão incontestável quanto qualquer um em todo o contexto da natureza, que, não obstante o homem mais sábio debaixo do sol não é capaz de explicar totalmente. "O vento sopra para onde quer", — não através do teu poder ou sabedoria; "e tu ouves o som dele", – tu estás absolutamente seguro, sem sombra de dúvida, que ele sopra; "mas tu não podes dizer de onde ele vem, nem para onde ele vai"; — a maneira precisa como ele começa e termina, se levanta e cai, nenhum homem pode dizer. "Assim é todo aquele que é nascido do Espírito". — Tu podes estar absolutamente seguro do fato, assim como do sopro do vento; mas a maneira precisa como ele é feito, como o Espírito Santo trabalha isso na alma, nem tu, nem o mais sábio dos filhos dos homens é capaz de explicar. 

(3) De qualquer modo, é suficiente para todo propósito racional e cristão, que, sem cair na mera curiosidade, das inquisições críticas, nós podemos dar um relato bíblico claro da natureza do novo nascimento. Isso irá satisfazer todo homem razoável, que deseja apenas a salvação de sua alma. A expressão "ser nascido de novo" não foi primeiramente usada por nosso Senhor em sua conversa com Nicodemos: Ela foi conhecida antes daquele tempo, e foi de uso comum entre os judeus, quando nosso Senhor apareceu no meio deles. Quando um pagão adulto estava convencido de que a religião judaica era de Deus, e desejava fazer parte dela, era costume batizá-lo, e se dizia que ele nasceu de novo; ou seja, aquele que era antes um filho do diabo, era agora, adotado na família de Deus, e considerado um de seus filhos.  Essa expressão, entretanto, que Nicodemos, sendo um "professor em Israel", deveria ter entendido bem, nosso Senhor usa na conversa com ele; apenas que num sentido mais forte do que ele estava acostumado. E isso seria a razão de sua pergunta: "Como essas coisas podem ser?". Elas não poderiam ser literalmente: — Um homem não pode "entrar, uma segunda vez, no útero de sua mãe, e nascer novamente": — Mas essas coisas podem ser compreendidas espiritualmente: Um homem pode nascer do alto; nascer de Deus; nascer do Espírito; numa forma que conduz a uma analogia bem próxima do nascimento natural.

(4) Antes de uma criança nascer no mundo, ela tem olhos, mas não vê; tem ouvidos, mas não ouve. Ela tem o mesmo uso imperfeito de qualquer outro sentido. Ela não tem o conhecimento de qualquer outra coisa do mundo, ou qualquer outro entendimento natural. Para esta maneira de existência, em que ela se encontra, então, nós não podemos dar o nome de vida. É apenas quando um homem nasce, que nós podemos dizer que ele começa a viver. Já que, tão logo nasce, ele começa a ver a luz, e os vários objetos que estão ao seu redor. Seus ouvidos, então, estão abertos, e ele ouve os sons que sucessivamente chegam até eles. Ao mesmo tempo, todos os outros órgãos do sentido começam a ser exercitados em seus objetos apropriados. Ele igualmente respira, e vive de uma maneira totalmente diferente do que ele vivia anteriormente.

Quão exato paralelo existe em todos esses exemplos! Enquanto um homem está, em um estado meramente natural, antes de ser nascido de Deus, ele tem, em um sentido espiritual, olhos e não vê; um véu grosso e impenetrável se estende sobre eles; ele tem ouvidos, mas não ouve; ele está totalmente surdo para o que ele deve, mais do que tudo, estar preocupado em ouvir. Seus outros sentidos espirituais estão encarcerados: Ele está, na mesma condição, como se ele não os tivesse. Por esse motivo, ele não tem conhecimento de Deus; nenhuma relação com ele; ele não está, afinal, familiarizado com ele. Ele não tem o conhecimento verdadeiro das coisas de Deus, assim como, das coisas espirituais ou eternas; assim sendo, embora ele seja um homem vivente, ele é um cristão morto. Mas, tão logo ele é nascido de Deus, há uma mudança total em todas essas particularidades.  Os "olhos de seu entendimento são abertos"; (tal é a linguagem do grande Apóstolo); e, Ele, que nos tempos antigos, "ordenou que a luz brilhasse fora da escuridão, brilhando em seu coração, ele vê a luz da glória de Deus"; seu amor glorioso, "na face de Jesus Cristo". Com seus ouvidos abertos, ele é agora capaz de ouvir a voz interior de Deus dizendo: "Tenha ânimo! Teus pecados foram perdoados de ti! Vá, e não peques mais!". 

Esse é o significado do que Deus fala ao seu coração; embora que, talvez, não nessas mesmas palavras. Ele está pronto a ouvir o que quer que "Ele, que leva ao homem conhecimento", se agrada de revelar a ele, de tempos em tempos. Ele "sente em seu coração" (para usar as palavras de nossa igreja), "o trabalho poderoso do Espírito de Deus"; não, em um sentido grosseiro e carnal, como o homem do mundo, estúpida e obstinadamente, mal interpreta a expressão; e, embora tenha sido dita a eles, várias vezes, nós não queremos dizer, nem mais, nem menos do que isso: Ele sente, e está interiormente sensível a isso, as graças com as quais o Espírito de Deus opera em seu coração. Ele sente, e está consciente disso, a "paz que excede todo entendimento". Ele, muitas vezes, sente tal alegria "inexprimível em Deus, e cheia de glória". Ele sente "o amor de Deus, espalhando-se, por todo seu coração através do Espírito Santo que é dado a ele": e todos os seus sentidos espirituais são, então, exercitados para discernir o bem e o mal espiritual.

Através do uso desses sentidos, ele está diariamente progredindo, no conhecimento de Deus, e de Jesus Cristo, a quem Ele enviou, e em todas as coisas pertinentes ao seu reino interior. E agora ele pode dizer, com toda propriedade, que ele vive: Deus o tendo vivificado, pelo seu Espírito, ele está vivo para Deus, por meio de Jesus Cristo. Ele vive a vida que o mundo não conhece, a "vida que se oculta com Cristo em Deus". Deus está continuamente respirando, assim como antes, em sua alma; e ela está respirando em Deus. A graça está em seu coração; e oração e louvor sobem aos céus: E, por esse intercurso entre Deus e o homem; essa camaradagem com o Pai e o Filho, assim como através de uma espécie de respiração espiritual, a vida de Deus em sua alma se mantém; e o filho de Deus cresce, até que ele se torna da "mesma medida e estatura de Cristo".

(5) Disso, evidentemente aparece qual é a natureza do novo nascimento: a grande mudança que Deus opera na alma, quando ele a traz para a vida; quando ele a ergue, de entre os mortos do pecado, para a vida de retidão. É a mudança forjada, em toda a alma, através do poderoso Espírito de Deus, quando ela é "criada de novo em Jesus Cristo"; quando ela é "renovada na busca da imagem de Deus, na retidão e santidade verdadeira"; quando o amor do mundo é trocado pelo amor de Deus; orgulho pela humildade; paixão pela brandura; o ódio, a inveja, e malícia, pelo amor sincero, terno e desinteressado por toda a humanidade. Em uma palavra, é aquela mudança onde a mente mundana, sensual e diabólica torna-se "a mente que estava em Jesus Cristo". Essa é a natureza do novo nascimento: "Assim é todo aquele que é nascido do Espírito".

III

(1) Não é difícil para aquele que tem considerado essas coisas, ver a necessidade do novo nascimento, e responder à terceira questão: Para que; com que finalidade é necessário que nós nasçamos novamente?

É muito facilmente discernido que isto é necessário. Primeiro, com o objetivo da santidade. Mas o que é santidade de acordo com a Palavra de Deus? Não uma mera religião externa, um círculo de obrigações exteriores, quantas sejam elas exatamente; e quão exatamente sejam executadas. Não: A santidade evangélica não é menos do que a imagem de Deus, estampada no coração; não é outra, do que toda a mente que estava em Jesus Cristo; ela consiste de todas as afeições celestes e temperamentos entrosados em um. Ela implica em tal amor ininterrupto e agradecido a Ele que não impediu seu Filho de nós; seu único filho; quando torna natural, e de certa maneira necessário a nós, que amemos cada filho do homem; quando nos preenche com misericórdia, bondade, gentileza, e longanimidade.

Tal é o amor que nos ensina a sermos irrepreensíveis, em todas as formas de conversação; como a nos capacitar a apresentar nossas almas e corpos; tudo que somos e temos; todos os nossos pensamentos, palavras e ações, como um sacrifício contínuo para Deus, aceitável através de Jesus Cristo. Agora, essa santidade pode não ter existência, até que sejamos renovados na imagem de nossa mente. Ela não se principia na alma, até que a mudança seja forjada; até que, pelo poder do Altíssimo esteja sobre nós, e sejamos "trazidos das trevas para a luz; do poder do diabo, para Deus"; ou seja, até que nasçamos novamente; o que, entretanto, é absolutamente necessário, com o objetivo da santidade.

(2) Mas, "sem santidade, nenhum homem verá o Senhor"; poderá ver a face de Deus na glória. Como conseqüência, o novo nascimento é absolutamente necessário para a salvação externa. Os homens podem, de fato, enganarem a si mesmo (tão desesperadamente mau, e tão enganoso é o coração do homem!), acreditando que eles podem viver, em seus pecados, até que venham para o último fôlego, e, mesmo assim, mais tarde, viverem com Deus; milhares realmente acreditam, que eles encontraram um caminho largo, que não conduz à destruição. "Que perigo", eles perguntam, "pode uma mulher ser, naquele que é tão inofensivo e virtuoso? Que medo há de que um homem tão honesto; alguém de tão estrita moralidade possa perder o paraíso; especialmente se, além de tudo isso, ele constantemente atender à igreja e aos sacramentos?".

Alguém irá perguntar com toda segurança: "O que! Eu não faço o bem ao meu próximo?". Sim, você faz, assim como seus vizinhos profanos; tanto quanto seus vizinhos que morrem em seus pecados! Porque vocês todos irão cair na mesma cova juntos; no inferno mais baixo! Vocês irão juntos para o lago de fogo; "o lago de fogo que queima com enxofre". Então, por fim, vocês verão a Deus (mas Deus concede que vocês possam ver antes!) a necessidade da santidade, com o objetivo da glória; e, conseqüentemente, do novo nascimento, uma vez que ninguém pode ser santo, exceto se nascer de novo.

(3) Por esse mesmo motivo, exceto se tiver nascido de novo, ninguém poderá ser feliz, mesmo nesse mundo. Já que é impossível, pela natureza das coisas, que um homem possa ser feliz, sem que seja santo. Mesmo o poeta pobre e profano nos diria, "nenhum homem mau é feliz". A razão é clara: Todo temperamento, que não é santo, é temperamento difícil: Não apenas a malícia, ódio, inveja, ciúme e desejo de vingança criam um inferno presente no peito, mas também as paixões mais brandas, se não mantidas dentro dos limites, trazem, milhares de vezes, mais dores do que prazer.

Até mesmo a "esperança", quando "adiada" (e quão freqüentemente esse é o caso!) "torna o coração doente", e todo desejo que não está de acordo com a vontade de Deus está propenso a nos "despedaçar, através das muitas tristezas": E todas essas fontes gerais de pecado — orgulho, vontade-própria, e idolatria — são, na mesma proporção que predominam, fontes de miséria geral. Entretanto, por quanto tempo, esses sentimentos reinarem, em nossa alma, a felicidade não terá lugar nela. No entanto, eles devem reinar até que a propensão de nossa natureza seja mudada; até que nós nasçamos de novo; conseqüentemente, o novo nascimento é absolutamente necessário, para que exista felicidade nesse mundo, do mesmo modo que no mundo que a de vir.

IV

Eu propus, em Último lugar, acrescentar algumas poucas inferências, que naturalmente se seguem das observações precedentes.

(1) O batismo não é novo nascimento: Eles não são um só, e a mesma coisa. Muitos realmente parecem imaginar que eles são exatamente o mesmo; pelo menos, eles falam, como se eles pensassem dessa forma; mas eu não sei se esta opinião é publicamente admitida, através de qualquer denominação cristã que seja. Certamente, não é através de alguma dentro desses reinos, se da Igreja Estabelecida, ou da parte dissidente dela. O julgamento da última é claramente declarado em um amplo Catecismo:

"Quais são as partes de um sacramento?".
As partes de um sacramento são duas: uma é o sinal exterior e sensível; a outra, a graça interior e espiritual; desse modo, representado.

"O que é batismo?".
O batismo é um sacramento, em que Cristo ordenou a lavagem com água, como sinal e selo da regeneração pelo seu Espírito.

Aqui está manifesto que o batismo, o sinal, é falado, de maneira distinta, da regeneração, e a coisa representada.

O julgamento de nossa Igreja está declarado com a mais extrema clareza:

"O que queres tu dizer com a palavra sacramento?".
Eu quero dizer o sinal exterior e visível da graça interior e espiritual.

"Qual é a parte exterior ou forma no batismo?".
A água, onde a pessoa é batizada, em nome do Pai, Filho e Espírito Santo.

"Qual é a parte interior, ou conseqüência?".
A morte no pecado, e um novo nascimento na retidão. Nada, entretanto, é mais claro do que isto: de acordo com a Igreja da Inglaterra, o batismo não é o novo nascimento. O motivo é tão claro e evidente que não precisa de outra autoridade.

"No que pode ser mais claro, para uma pessoa, do que uma coisa visível, e outra invisível, e, conseqüentemente, totalmente diferente uma da outra?".
Uma sendo o ato do homem, purificando o corpo; e a outra, a mudança forjada por Deus na alma: De modo que a primeira distingue-se justamente da última, assim como a alma do corpo, ou a água do Espírito Santo.

2) Das reflexões precedentes, nós podemos, em Segundo Lugar, observar que, como o novo nascimento não é a mesma coisa que o batismo, então, ele nem sempre acompanha o batismo: Eles não andam constantemente juntos. Um homem pode possivelmente "nascer da água", e, ainda assim, "não nascer do Espírito".  Pode existir, algumas vezes, sinal exterior, quando não existe a graça interior. Eu não falo com respeito às crianças: É certo que nossa Igreja supõe que todo aquele que é batizado, na infância, estão, ao mesmo tempo, nascendo de novo; e é permitido que o Ofício total do Batismo das Crianças origine-se dessa suposição. Nem é alguma objeção, de qualquer relevância, contra o fato de que nós não podemos compreender como esse trabalho pode ser forjado nas crianças. Já que nós nem podemos compreender, como ele é forjado na pessoa na idade madura. Mas, qualquer que seja o caso com as crianças, é certo que todos aqueles, em idade madura, que sejam batizados, não estão, ao mesmo tempo, nascendo novamente. "A árvore é conhecida pelos seus frutos". E, por meio disso, parece muito claro, para ser negado, que diversos desses que foram crianças do mal, continuem a ser os mesmos depois do batismo: "já que eles fazem o trabalho do pai deles": Eles continuam servos do pecado, sem pretensão à santidade interior, ou exterior.

(3) A Terceira inferência, que nós podemos esboçar do que tem sido observado, é que o novo nascimento não é o mesmo que santificação. Isto é tomado realmente como confirmado por muitos; particularmente, por um eminente escritor, em seu último tratado sobre "A Natureza e Alicerces da Regeneração Cristã". Para acenar diversas outras objeções relevantes, que poderiam ser feitas para aquele tratado, aqui está uma que é palpável: Há muito tempo, tem-se falado da regeneração, como um trabalho progressivo, que é levado, na alma, através de graus vagarosos, do momento de nosso primeiro regresso para Deus. Isso é, incontestavelmente, a verdade da santificação; mas o novo nascimento não é verdade da regeneração. Essa é uma parte da santificação, não, o todo; é o portal para ela; a sua entrada. Quando nós nascemos novamente, então, nossa santificação - nossa santidade interior e exterior - começa; e, daquele momento em diante, gradualmente, "crescemos Nele que é nossa Cabeça". Essa expressão do Apóstolo ilustra admiravelmente a diferença entre uma e a outra; e, posteriormente aponta a exata analogia que há entre as coisas naturais e espirituais. A criança nascida da mulher, de repente, ou depois de um curto espaço de tempo, gradualmente, e com crescimentos sucessivos, chega à estatura de um homem; dessa mesma forma, a criança que nasce de Deus, em um curto período de tempo, se não, imediatamente, através de passos sucessivos, chega à medida de toda estatura de Jesus Cristo. A mesma relação, entretanto, que há entre nosso nascimento natural e nosso crescimento para a vida adulta, existe também entre nosso novo nascimento e nossa santificação.  

(4) Um ponto a mais que podemos aprender, das observações precedentes, é um ponto de tão grande importância, que não podemos nos recusar de considerá-lo, mais cuidadosamente, dando seguimento a ele, com alguma minúcia.

O que deve alguém que ama as almas dos homens, e está angustiado que nenhuma delas possa perecer, dizer àqueles que ele vê, não respeitando o dia do Senhor; vivendo a embriaguez; ou qualquer outro pecado obstinado? O que ele pode dizer, se as observações precedentes são verdadeiras, a não ser que "ele deve nascer de novo?".

"Não", diz um homem zeloso, "isto não pode ser! Como você pode falar, de maneira, não misericordiosa a este homem? Ele já não havia se batizado? Então, ele não pode nascer novamente!".

Ele não pode nascer de novo? E isto que você está afirmando? Então, ele não pode ser salvo! Embora ele tenha uma idade tão avançada como Nicodemos tinha, ainda assim, "exceto se ele nascer novamente, ele não poderá ver o reino de Deus". Por conseguinte, ao dizer que "ele não pode nascer novamente", você, de fato, o está entregando à condenação; E onde se está a falta de misericórdia agora? Do meu lado, ou do seu? Eu repito que ele deve nascer de novo, e, então, se tornar um herdeiro da salvação. Você diz, "Ele não pode nascer de novo": Se fosse assim, ele inevitavelmente iria perecer! Assim, você impede totalmente o caminho da salvação dele, e o envia ao inferno, fora da mera caridade!

Mas, talvez, o próprio pecador, a quem, na verdadeira misericórdia, podemos dizer, "Você deve nascer novamente", tenha sido ensinado a dizer, "Eu desprezo sua nova doutrina; eu não preciso nascer novamente; eu nasci novamente, quando fui batizado. O que! Você quer que eu negue o meu batismo?".

Eu respondo, Primeiro, que não há nada, debaixo dos céus, que possa desculpar uma mentira; caso contrário, eu diria a um pecador declarado: se você foi batizado, você não possuiu isto. Quão potencialmente isso agrava a sua culpa! Como aumentará a sua condenação! Você estava devotado a Deus, aos oito anos de idade? E, todos esses anos, você não tem sido devotado ao diabo? Você não foi, mesmo antes do uso da razão, consagrado a Deus, ao Pai, ao Filho, e ao Espírito Santo? E você, desde que começou a fazer uso dela, não tem flutuado, na face de Deus, e consagrado a si mesmo ao diabo?

A abominação da desolação - o amor da palavra, orgulho, ira, luxúria, desejos tolos, e toda série de afeições vis – está onde não deveria estar? Você não tem colocado todas as coisas execráveis, naquela alma que, uma vez, foi o templo do Espírito Santo; reservada para a "habitação de Deus, através do Espírito"; sim, solenemente, entregue a ele? E você não se gloria nisso, de que você, uma vez, pertenceu a Deus? Oh! Envergonhe-se! Enrubesça! Esconda-se na terra! Não se glorie mais do que o preenche com confusão, e faz com que você se envergonhe diante de Deus e do homem!

Eu respondo, em Segundo Lugar, você já negou o seu batismo; e isto, da maneira mais eficaz. Você o negou, milhares de vezes; e você ainda o nega, dia-a-dia; já que, em seu batismo, você renunciou ao mal, e às todas as suas obras. Quando quer, entretanto, que você dá lugar a ele novamente; quando quer que você realize alguma de suas obras, então, você nega o seu batismo. Por conseguinte, você o nega, por meio dos pecados obstinados; por meio de todos os atos de sujidade, bebedeira, ou vingança; por meio de toda palavra obscena e profana; através de praga que sai de sua boca. Todo tempo, você profana o dia do Senhor; você, por meio disso, nega seu batismo; sim, todo tempo, você faz alguma coisa para alguém, que você não gostaria que ele fizesse a você.

Eu respondo, Terceiro Lugar, seja batizado ou não, "você deve nascer de novo"; do contrário, não é possível que você seja santo internamente; e sem a santidade interior, assim como a exterior, você não pode ser feliz, mesmo nesse mundo, muito menos, no mundo que há de vir.

Você diz: "Não, eu não causo dano algum a qualquer homem; eu sou honrado e justo em meus procedimentos; eu não praguejo, ou tomo o nome do Senhor em vão; eu não profano o dia do Senhor; eu não sou alcoólatra; eu não difamo meu próximo, nem vivo, em qualquer pecado obstinado". Se for dessa forma, que todo homem chegue até onde você chegou; no entanto, ainda assim, você deve ir mais longe, ou você não poderá ser salvo: ainda assim, você deve "nascer de novo”. 

E você acrescenta: "Eu já fui além; já que eu, não apenas, não causo dano, como faço todo bem que posso". Eu duvido desse fato; eu temo que você teve milhares de oportunidades de fazer o bem, o qual você sofreu para executar, por não estar aperfeiçoado, e pelo qual, por conseguinte, você é responsável perante Deus. Mas, se você os tem melhorado; se você tem realmente feito todo o bem, que você possivelmente poderia fazer a todo homem, ainda assim, isso, de forma alguma, altera seu caso; "você ainda deve nascer novamente".  Sem isso, nada fará bem à sua pobre, pecadora e contaminada alma.

"Não, mas eu atendo constantemente todas as ordenanças de Deus: eu mantenho minha igreja e o sacramento". É bom que você o faça: Mas, tudo isso não irá mantê-lo longe do inferno, exceto se você nascer novamente. Ir à igreja, duas vezes ao dia; sentar-se à mesa do Senhor, toda semana; orar sempre em privativo; ouvir sempre os bons sermões; ler sempre todos os bons livros; ainda assim, "você deve nascer de novo". Nenhuma dessas coisas irá substituir o lugar do novo nascimento; não, nem qualquer outra coisa debaixo dos céus. Permita-se, entretanto, se você ainda não experimentou essa obra interna de Deus, estar em oração contínua: "Senhor, acrescenta isso a todas as tuas bênçãos, -- que eu possa nascer novamente! Negues o que quer que te agrades, mas não negues isto; deixa-me 'nascer do alto!'. Joga fora o que quer que pareça a ti bom – reputação, fortuna, amigos, saúde – e apenas dá-me isto, nascer do Espírito; ser recebido entre os filhos de Deus! Deixa-se nascer 'não, da semente corruptível, mas incorruptível, através da palavra de Deus, que vive e que permanece para sempre'; e, então, deixa-me diariamente 'crescer na graça e no conhecimento de nosso Senhor, e Salvador Jesus Cristo!".


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Este sermão foi originalmente editado por Michael Anderson, estudante da Northwest Nazarene College (Nampa, ID), com correções por George Lyons para o Wesley Center for Applied Theology. Ele foi designado para o "John Wesley Holiness of Heart and Life" web site at http://gbgm-umc.org/UMW/Wesley/index.html.

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