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sexta-feira, 6 de dezembro de 2013
Tarsila do Amaral
À margem da Semana de Arte Moderna, despontaram algumas personalidades importantes, sem as quais não seria possível apresentar um quadro completo da criação modernista, pois sua obra é fundamental tanto pelo nível expressivo quanto pela originalidade da solução. E não é exagerado afirmar que entre esses criadores isolados se encontram alguns dos maiores artistas brasileiros deste século, como Tarsila do Amaral, Antônio Gomide, Celso Antônio de Meneses e Osvaldo Goeldi. Tarsila do Amaral nasceu em Capivari, no interior do Estado de São Paulo. Estava perto dos trinta anos quando, em 1916, -deu início à sua carreira de artista, tornando-se aluna dos escultores Zadig e Mantovani.
Em 1917 era aluna de Pedro Alexandrino, nada tendo feito que deixasse pressupor o altonível que atingiria sua pintu ra, anos mais tarde. Depois dc curto estágio no ateliê do pin tor alemão Georg Fischer Elpons, em 1920 Tarsila seguiu para a Europa, cursando por algum tempo a Academia Julian, de Paris, e o ateliê de Émile Renard, retratista da moda. Certas figuras femininas de Tarsila, executadas por volta de 1922, em pálidas cores com predomínio de azuis, evocam diretamente o estilo desse mestre, o qual teve o mérito de encorajá-la em direção à modernidade. Em 1922, Tarsila expunha em Paris, no pacato Salão dos Artistas Franceses, uma pintura que evocava o passado, sem remeter ao futuro. Nesse mesmo ano, contudo, retornando ao Brasil, decidiu modificar sua orientação estética; ao mesmo tempo, ligou-se aos intelectuais que formavam o Grupo Klaxon: Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti dei Picchia e Sérgio Buarque de Holanda, entre outros. Logo depois formou, com os três primeiros e Anita Malfatti, o Grupo dos Cinco, de vida efêmera; em 1923 encontrava-se de novo em Paris para estudar seriamente. Em janeiro de 1923, ainda sob a influência do Impressionismo, pintou Paquita, a Espanhola. Na obra seguinte — A Negra — já se acham algumas das características que marcam sua grande obra. Por essa época, a artista começou a freqüentar os ateliês dos principais mestres cubistas. Como escreveu Sérgio Milliet, em 1924, na Revista do Brasil, "André Lhote foi o seu primeiro mestre. Com ele conheceu a necessidade de uma reação contra o boichevismo impressionista. Lhote, pintor secundário, é excelente professor. Traço de união entre o cubismo e o academismo. Seu segundo mestre foi Fernand Léger. Mais um passo para a frente: mecanismo da vida moderna, assunto novo, síntese, ritmo, movimento. Quis, porém, conhecer os requintes da nova tendência e dirigiu-se a Albert Gleizes. Geometria, abstração do objeto, criação. Passou pelas três fases do cubismo. Convinham-lhe todas parcialmente. E continuou a ser Tarsila do Amaral". Ao mesmo tempo que seu espírito se abria e amadurecia, Tarsila conhecia Picasso e De Chirico, Brancusi, Manuel de Falia, Stravinsky, André Breton, Cendrars, John dos Passos e outros plasmadores da arte do século XX. Em 1924, durante uma viagem às cidades históricas de Minas Gerais, em companhia de Oswald de Andrade e do poeta Blaise Cendrars, Tarsila descobriu o Bra-sil: as obras que compôs nos anos seguintes constituem a fase "pau-brasil", da qual E. E. C. B. é altamente significativa. Tal fase resume-se, segundo Sérgio Milliet, em alguns poucos ingredientes: "As cores ditas caipiras, rosas e azuis, as flores de baú, a estilização geométrica das frutas e plantas tropicais, dos caboclos e negros, da melancolia das cidadezinhas, tudo isso enquadrado na solidez da construção cubista". Em 1926 Tarsila casou-se com Oswald de Andrade. Um dia, em 1928, surgiu-lhe, sem premeditação, um quadro diferente, início da chamada fase "antropofágica", na qual se situam seus quadros mais importantes. A própria Tarsila assim descreve o início dessa fase: "Eu quis fazer um quadro que assustasse o Oswald, uma coisa que ele não esperava. Aí é que vamos chegar no Abaporu. O Abaporu era figura monstruosa, a cabecinha, o bracinho fino, aquelas pernas compridas, enormes, e junto tinha um cacto, que dava a impressão de um sol, como se fosse também uma flor. Oswald ficou assustadíssimo e perguntou: ‘Mas o que é isso? Que coisa extraordinária!’ Ele telefonou para o Raul Bopp: ‘Venha imediatamente aqui, que é para você ver uma coisa!’ Raul Bopp foi lá no meu ateliê, na rua Barão de Piracicaba, assustou-se também. Oswald disse: ‘Isso é como se fosse selvagem, uma coisa do mato’, e o Bopp concordou. Eu quis dar um nome selvagem também ao quadro e dei Abaporu, palavra que encontrei no dicionário de Montoya, da língua dos índios. Quer dizer ‘antropófago’ ". Baseando-se nessa obra, Oswald de Andrade elaborou toda uma teoria, da qual a Revista de Antropofagia seria o órgão oficial. Em 1931 Tarsila viajou para a União Soviética, chegando a realizar, em Moscou, uma exposição individual; ao regressar, impressionada com o que lá observara, pintou alguns quadros de tema social, entre eles duas obras-primas: Operários e 2•a Classe. Essa fase social pouco duraria, pois logo em seguida a artista retornou à sua temática caipira, agora resolvida num espírito talvez mais lírico.
Tais retornos de Tarsila a fases anteriores tornaram-se habituais: em 1946, pintL ras como Primavera ou Praias retomavam "o gigantismo onírico da fase antropofágica, agora imersa num lirismo novo, pontilhista quase, em meios tons"; Fazenda outras obras feitas após 1950 de novo apresentam "as tônicas da fase pau-brasil no colorido de baú, porém sensivelmente suavizado". Na verdade, concluída sua fase social dos anos 30, Tarsila repetia-se Sua última grande obra — o mural Procissão do Santíssimo em São Paulo no Século XVIII — foi-lhe encomendada em l95~ pelo Governo do Estado de São Paulo. Tarsila do Amaral faleceu a 17 de janeiro de 1973, deixando obra relativamente pequena: cerca de 250 óleos, meia dúzia de esculturas, três gravuras e umas poucas centenas de desenhos, conforme o recenseamento levado a cabo por sua biógrafa Aracy Amaral. Uma das precursoras do que se poderia chamar de pintura nacional brasileira, Tarsila soube emprestar a seus temas um lirismo intenso, adaptando formas e cores brasileiras à severa disciplina cubista.
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