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domingo, 19 de abril de 2020

A Natureza do Entusiasmo



John Wesley

'Fazendo ele deste modo a sua defesa, disse Festo em alta voz: Estás louco, Paulo; as muitas letras te fazem delirar'. (Atos 26:24)

[O sermão, A Natureza do Entusiasmo, foi publicado, primeiro, no III Vol. dos Sermões, em 1759, e, pelo menos, em três edições diferentes, durante a vida de Wesley. Todo o capítulo foi assunto de uma série de exposições na Foundery, em Dezembro de 1740, e em Bristol (ou Kingswood?), anterior a Maio. Este verso está registrado, como tema, na Capela (West Street), no Natal de 1752, e em Londres (presumivelmente na Foundery), no dia seguinte. Nesta presente forma, ele foi provavelmente um daqueles preparados para publicação em Novembro e Dezembro de 1749. Ele se propõe a responder à responsabilidade de 'Entusiasmo', que fora feita contra Wesley e os Metodistas, desde 1739. Em 14 de Outubro de 1739, o Rev. Charles Wheatley, pregando na Catedral de St. Paul, descreveu os Metodistas, como 'entusiastas arrebatadores, pregando sensações incontáveis, emoções violentas, e mudanças súbitas; orgulhando-se das inspirações imediatas, e fazendo reivindicações profanas de milagres maiores do que os que, alguma vez, fora realizado, até mesmo pelo próprio Cristo'.]

[No mesmo ano, Dr. Joseph Trapp pregou quatro sermões, em diferentes igrejas de Londres, contra 'as doutrinas e práticas de uns certos entusiastas modernos', e os publicou. O Rev. Josiah Tucker acusou Whitefield de 'noções profanas e entusiastas'; e o Bispo Gibsom, em sua Responsabilidade Pastoral de Augusto I, acusa os Metodistas de entusiastas em nove acusações, perante o Juízo: quanto às suas reivindicações às comunicações extraordinárias de Deus; à missão especial; à inspiração divina; ao poder divino em suas pregações; ao dom do Espírito Santo; à profecia; de serem iguais aos Apóstolos, e até mesmo a Cristo; de serem pregadores de um novo evangelho; e de usarem métodos extraordinários de ensino. Panfleto seguido de panfleto, alguns mais indecentes e abusivos do que outros, mas todos concomitantes na responsabilidade do Entusiasmo. O Scots Magazine e o Weekly Miscellany foram proeminentes em atacar os 'entusiastas endoidecidos'].

[Atravessando a quantidade de criticas menores, nós chegamos em 1744, às Anotações da Igreja, do Rev. Thomas, sobre o recente Dário de Wesley, uma apreciação desfavorável tranqüila e razoável; ele era, como o próprio Wesley disse em 1777, 'um cavalheiro, um estudioso e um cristão; e como tal, ele talava e escrevia'; e o responde no mesmo espírito].

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1. E assim diz o mundo todo, os homens que não conhecem a Deus, de todos aqueles que são da religião de Paulo: de todos aqueles que são, então, seguidores dele, como ele foi de Cristo. É verdade, existe uma espécie de religião; mais do que isto, ela é chamada de Cristianismo também, que pode ser praticada sem qualquer culpa, o que é geralmente consistente com o bom-senso, -- ou seja, a religião da forma, uma série de deveres exteriores, executados de uma maneira decente e regular. Você pode acrescentar ortodoxia nisto, um sistema de opiniões corretas; sim, e alguma quantidade de moralidade pagã; e, ainda assim, não muitos irão afirmar que 'muita religião os tornou loucos'.  Mas, se você almeja a religião do coração, se você fala da 'retidão, e paz, e alegria no Espírito Santo', então, não demorará muito antes que sua afirmação termine, 'Tu estás fora de ti'.

2. E não é um elogio que os homens do mundo fazem a você aqui. Eles, pelo menos uma vez dizem o que eles querem dizer. Ele não apenas afirmam, mas cordialmente acreditam que está louco aquele que diz que 'o amor de Deus está espalhado em todo' seu 'coração pelo Espírito Santo dado a ele'; e que Deus o tem capacitado a regozijar-se em Cristo 'com alegria inexprimível e cheio de glória'. Se um homem está, de fato, vivo para Deus, e morto para todas as coisas aqui embaixo; se ele continuamente vê a Ele que é invisível, e assim, caminha pela fé, e não pela vista; então, eles consideram que este é um caso claro: além de qualquer discussão, 'muita religião o deixou louco'.  

3. É fácil observar que a coisa determinante que o mundo considera loucura é este extremo desprezo por todas as coisas temporais, e a firme busca pelas coisas eternas; esta convicção divina das coisas que não são vistas; este se regozijar no favor de Deus, neste feliz e santo amor de Deus; e este testemunho do Seu Espírito em nosso espírito de que somos os filhos de Deus, -- ou seja, na verdade, todo o espírito, vida e poder da religião de Jesus Cristo.

4. Eles irão, contudo, permitir, em outros aspectos, que este homem aja ou fale, como alguém em seu juízo perfeito. Em outras coisas, ele é um homem razoável, é apenas nestas instâncias que sua cabeça é afetada. Reconhece-se, portanto, que a loucura, sob a qual ele lida, é de um tipo específico; e, assim, eles estão acostumados a distingui-la por um nome particular, 'entusiasmo'.

5. Um termo, que é freqüentemente usado, e que raramente está fora da boca dos homens; e, ainda assim, é dificilmente entendido, mesmo por aqueles que o usam com mais freqüência.  Ele pode ser, entretanto, não aceitável aos homens sérios, a todos que desejam entender o que eles falam ou ouvem, se eu me esforçar para explicar o significado deste termo – mostrar de que se trata o entusiasmo. Pode ser um encorajamento para aqueles que são injustamente responsabilizados por ele; e pode possivelmente ser de utilidade para alguns que são merecidamente responsabilizados por ele; pelo menos, aos que seriam assim, não fossem tão cuidadosos contra ele.

6. Uma vez que geralmente admite-se que a própria palavra seja extraída do Grego. Mas, de onde a palavra grega, "enthousiasmos" é derivada, ninguém ainda foi capaz de mostrar; alguns têm se esforçado para derivá-la da palavra grega (theOi) que significa – em Deus; porque todo entusiasmo se refere a Ele.  Mas isto é completamente forçado; existe pequena semelhança entre a palavra derivada, e a que eles se empenham para derivar. Outros a derivariam (en thysiai), -- em sacrifício; porque muitos entusiastas do passado eram afetados, da maneira mais violenta durante o momento de sacrifício. Talvez, seja uma palavra fictícia, inventada do barulho que alguns dos que eram assim afetados faziam.

7. Não é improvável que um motivo porque esta palavra desconhecida tenha sido preservada em tantas Línguas, seja porque os homens estavam mais preocupados com respeito ao seu significado do que com respeito à sua derivação. Eles, portanto, adotaram a palavra grega, porque eles não a entenderam: eles não a traduziram em suas próprias línguas, porque eles não sabiam como; ela tem sido sempre uma palavra com um sentido vago e incerto, para o qual nenhum significado foi afixado.

8. Não é, portanto, surpresa, afinal, que ela seja usada de maneira tão diversa; pessoas diferentes a entendem, de diferentes maneiras, completamente inconsistentes umas com as outras. Alguns a tomam em um bom sentido, devido a um impulso divino ou impressão, superiores a todas as faculdades naturais, e suspendem, por um tempo, quer parte quer todo os seus sentidos exteriores. Neste significado da palavra, tantos os Profetas da Antiguidade, quanto os Apóstolos eram necessariamente entusiastas; estando, em seus diversos tempos, tão preenchidos com o Espírito Santo, e de tal forma, influenciados por Ele, que habita nos corações, que o exercício da razão, de seus sentidos, e de suas habilidades naturais, estando suspensos, eles foram completamente tomados pelo poder de Deus, que 'falavam' apenas 'quando eles eram movidos pelo Espírito Santo'.

9. Outros tomam a palavra em um sentido indiferente; nem moralmente bom, nem mal: assim, eles falam do entusiasmo dos poetas; de Homero de Virgílio, em específico. E nisto, um recente escritor eminente foi mais longe ao afirmar que não existe homem excelente em sua profissão, qualquer que ela seja, que não tenha em seu temperamento um forte traço de entusiasmo. Por entusiasmo, esses parecem entender, todo o vigor incomum do pensamento; um fervor peculiar de espírito, uma vivacidade e força não encontradas nos homens comuns; elevando a alma para coisas maiores e mais sublimes do que a pura razão poderia ter conseguido.

10. Mas nenhum desses é no sentido em que a palavra 'entusiasmo' é mais usualmente entendida. A generalidade dos homens, se não concordam até ai, pelo menos concordam, no concernente a ela, de que se trata de alguma coisa má: e este é plenamente o sentimento de todos aqueles que chamam a religião do coração de 'entusiasmo'. Assim sendo, eu devo considerá-la nas páginas seguintes, como um mal, um infortúnio, se não um engano.

11. Como a natureza do entusiasmo é, indubitavelmente, uma desordem da mente; e como essa tal desordem esconde grandemente o exercício da razão. Mais do que isto, como ela, algumas vezes, a coloca totalmente aparte: ela não apenas obscurece, mas fecha os olhos do entendimento. Ela pode, portanto, ser considerada uma espécie de loucura; de loucura, preferivelmente à insensatez: vendo-se que um tolo é propriamente alguém que tira conclusões erradas de premissas corretas. E assim. O entusiasta supõe que suas premissas sejam verdadeiras, e suas conclusões necessariamente a seguem. Mas aqui se coloca seu erro: suas premissas são falsas. Ele imagina ser o que ele não é: e, portanto, colocando de maneira errada, quanto mais além ele vai, mais se desvia do caminho.

12. Todo entusiasta, então, propriamente é um louco. Ainda assim, ele não é um louco comum, mas um louco religioso. Por 'religioso', eu não quero dizer que se trate de alguma parte da religião: completamente o contraio. Religião é o espírito de uma mente sã; e, conseqüentemente, se coloca em oposição direta à loucura de todo tipo. Mas eu quero dizer, a loucura tem a religião como seu objeto; ela está ligada à religião. E assim, os entusiastas estão geralmente falando de religião, de Deus, ou das coisas de Deus, mas falando de uma maneira que todo cristão consciente pode discernir que se trata de uma desordem da mente. Entusiasmo, em geral, pode, então, ser descrito de uma maneira como esta? Uma loucura religiosa surgindo de alguma influência ou inspiração de Deus, falsamente imaginada: pelo menos, do imputar alguma coisa a Deus, que não deva ser imputado a Ele; ou esperar alguma coisa de Deus, que não deva se esperar Dele.

13. Existem inumeráveis formas de entusiasmo. Esses que são mais comuns, e por esta razão, mais perigosos, eu devo me esforçar para reduzir a alguns poucos tópicos gerais, para que sejam mais facilmente entendidos e evitados.

            O primeiro tipo de entusiasta que eu devo mencionar são aqueles que imaginam que têm a graça que eles não têm. Assim, alguns imaginam que têm a redenção de Cristo, 'mesmo o perdão dos pecados', e não é bem assim. Esses usualmente são como se 'não tivessem raízes em si mesmos'; nem profundo arrependimento, ou completa convicção. 'Embora recebam a palavra com alegria', E 'porque eles não estão fincados na terra', não existe obra profunda em seus corações, portanto, a semente 'brota imediatamente'. Existe imediatamente uma mudança superficial que, junto com a alegria sutil, interrompendo com o orgulho de seus corações quebrantados, e com seu amor próprio excessivo, facilmente persuade a eles que eles já 'provaram a boa palavra de Deus, e os poderes do mundo vindouro'.

14. Este é necessariamente um exemplo do primeiro tipo de entusiasmo: uma espécie de loucura, surgindo da imaginação de que eles têm aquela graça que, na verdade, eles não têm: de modo que eles apenas enganam suas próprias almas. Isto pode ser chamado corretamente de loucura: porque o raciocínio desses pobres homens está correto; suas premissas são boas; mas como esses são meras criaturas da própria imaginação, então, tudo que está construído neles cai por terra. O alicerce de seus devaneios é este: eles imaginam que têm a fé em Cristo. Se eles tivessem, eles seriam os 'reis e sacerdotes de Deus': possuiriam 'o reino que não pode ser movido': mas eles não têm; conseqüentemente, todo o comportamento seguinte deles está tão longe da verdade e sobriedade, quanto o de um louco comum, que se imaginando um rei terreno, fala e age desta forma.

15. Existem muitos outros entusiastas deste tipo. Tal, por exemplo, é o ardoroso zelote da religião; ou mais, propriamente, devido às opiniões e modos de adoração que ele dignifica com este nome. Este homem, também, fortemente se imagina um crente em Jesus; sim, imagina que ele é um campeão, por causa da fé que uma vez foi entregue aos santos. Assim sendo, toda sua conduta é formada encima desta vã imaginação. E admitindo-se que esta suposição seja justa, ele terá algumas justificativas toleráveis para seu comportamento; considerando que agora este é evidentemente o resultado de um cérebro desequilibrado, e de um coração perturbado.

16. Mas o mais comum de todos os tipos de entusiastas são aqueles que se imaginam cristãos, e não o são. Esses abundam, não apenas em todas as partes de nossa nação, mas na maioria dos lugares habitados da terra. Que eles não são cristãos, isto é claro e inegável; se nós cremos nos oráculos de Deus. Porque os cristãos são santos; esses são iníquos: os cristãos amam a Deus, esses amam o mundo: Os cristãos são humildes; esses são orgulhosos: os cristãos são gentis; esses são passionais; os cristãos têm a mente que estava em Cristo; esses estão a uma distância extrema disto. Conseqüentemente, eles não são mais cristãos do que são arcanjos. Ainda assim, eles se imaginam serem; e podem dar diversas razoes para isto: porque eles foram batizados muitos anos atrás; porque abraçaram as opiniões cristãs, vulgarmente denominadas de fé cristã ou católica; eles usam os modos cristãos de adoração, como seus antepassados fizeram antes deles; eles vivem o que é chamado de uma boa vida cristã, como o restante de seus vizinhos faz. E quem ousaria pensar ou dizer que esses homens não são cristãos? – não obstante, sem um grão da fé verdadeira em Cristo, ou da verdadeira santidade interior; sem alguma vez terem testado o amor de Deus, ou 'sido feitos parceiros do Espírito Santo'!'.

17. Ah! Pobres enganadores de si mesmos! Vocês não são cristãos. Mas entusiastas, e do grau mais alto. Médicos, curem a si mesmos! Mas, primeiro, conheçam sua doença: toda a vida de vocês é entusiasmo: toda adequada à imaginação de que vocês receberam a graça de Deus, sem a terem recebido. Em conseqüência deste grande equívoco, vocês falam irrefletidamente, dia após dia, falando e agindo, sob um caráter que, de maneira alguma, pertence a vocês.  Disto, surge aquela inconsistência palpável, latente, que corre através de todo o comportamento de vocês; uma impraticável mistura de Ateísmo real e Cristianismo imaginário. Ainda assim, como vocês têm tão vasta maioria do lado de vocês, vocês irão sempre levar isto, meramente por meio da força de números, 'de que vocês são os únicos homens em seus sentidos, e todos que não são como vocês, são lunáticos'. Mas isto não altera a natureza das coisas. À vista de Deus e de Seus santos anjos, sim, e de todos os filhos de Deus, sobre a terra, vocês são meros loucos, meros entusiastas, todos! Vocês não são? Vocês não estão 'caminhando em sombra vã; uma sombra da religião; uma sombra da felicidade?'. Vocês não estão se desinquietando em vão, com infortúnios tão imaginários quanto sua felicidade na religião? Vocês não se imaginam grandes e bons – com muito conhecimento e muito sábios? Por quanto tempo? Talvez, até que a morte os traga de volta aos sentidos, para lamentarem sua tolice para todo sempre!'.

18. Uma segunda espécie de entusiastas são aqueles que imaginam que eles têm os dons de Deus. Assim, alguns se imaginam dotados com o poder de realizar milagres, de curar o doente, através de uma palavra e toque; de restaurar a vista do cego: sim, até mesmo, de ressuscitar o morto – um exemplo notório do que é ainda recente em nossa própria história. Outros profetizam; predizem coisas, e isto com uma certeza e exatidão extrema. Mas um pouco de tempo usualmente convence estes entusiastas. Quando os fatos vão ao encontro de suas previsões, a experiência executa o que a razão não pode, e eles caem em si.

19. A essa mesma categoria, pertencem aqueles que pregam ou oram, imaginando-se influenciados pelo Espírito de Deus, o que, de fato, não estão. Eu estou consciente que, sem Ele, nós não podemos fazer coisa alguma, mais especialmente, em nosso ministério público; de que toda a nossa pregação é completamente em vão, a menos que seja atendida com o poder de Deus; e assim toda a nossa oração, a menos que Seu Espírito, nela, nos ajude em nossas enfermidades. Eu sei que, se nós não pregamos e oramos através do Espírito, tudo não passará de trabalho perdido; uma vez que a ajuda que é feita na terra, Ele, que opera tudo em todos, a faz por Si mesmo. Mas isto não afeta o caso diante de nós.  Embora exista uma influência real do Espírito de Deus, existe também uma imaginária: e muitos existem que confundem uma com a outra. Muitos supõem que estão sob aquela influência, quando não estão, quando ela está muito longe deles. E muitos outros supõem que eles estão mais sob aquela influência do que realmente estão. Deste número, eu temo, são todos aqueles que imaginam que Deus dita as próprias palavras que eles falam; e que, conseqüentemente, é impossível que eles possam falar alguma coisa inoportuna, quer no assunto ou na maneira de falá-la. Sabe-se bem, que muitos entusiastas deste tipo têm aparecido também durante o presente século; alguns dos quais falam de uma maneira mais autoritária do que Pedro ou quaisquer dos Apóstolos.

20. A mesma espécie de entusiasmo, embora em um grau menor, é freqüentemente encontrada em homens de um caráter privado. Eles podem igualmente imaginar que estejam influenciados ou dirigidos pelo Espírito, quando eles não estão. Eu admito que 'se algum homem não tem o Espírito de Cristo, ele não é Dele'; e que, se alguma vez, nós pensamos, falamos, ou agimos certo, foi através da assistência deste abençoado Espírito. Mas quantos imputam coisas a Ele, ou esperam coisas Dele, sem qualquer alicerce bíblico ou racional! Tais são aqueles que imaginam que eles fazem ou devem receber direções específicas de Deus, não apenas nos pontos relevantes, mas em coisas sem importância; na maioria das circunstâncias frívolas da vida. Considerando que, nestes casos, Deus nos deu nossa própria razão como guia; embora nunca exclua a assistência secreta de Seu Espírito.

21. Aqueles que evidenciam serem dirigidos por Deus, se nas coisas espirituais, ou na vida comum, naquilo que é merecidamente chamada de uma maneira extraordinária: ou seja, através de visões ou sonhos; através de fortes impressões ou impulsos repentinos da mente, são aqueles que peculiarmente estão expostos a este tipo de entusiasmo. E não nego que, nos tempos antigos, Deus tenha manifestado Sua vontade desta maneira; ou, que Ele pode fazer desta forma agora: mais do que isto, eu acredito que Ele faz, em algumas muito raras estâncias. Mas quão freqüentemente os homens erram nisto! Como eles são enganados pelo orgulho, e por uma imaginação inflamada, ao atribuírem tais impulsos ou impressões; sonhos ou visões, a Deus, uma vez que estes são totalmente indignos Dele! Agora isto é puro entusiasmo; tudo tão longe da religião, quanto é da verdade e sobriedade.

22. Talvez, alguns possam perguntar: 'Eu não devo, então, inquirir qual a vontade de Deus em todas as coisas? E a vontade Dele não deve ser a regra de nossa prática?'. Inquestionavelmente, você deve. Mas como um cristão desapaixonado deve fazer esta pergunta? Para saber qual a vontade de Deus? Não, esperando por sonhos sobrenaturais; nem esperando Deus revelar-lhe em visões; não, procurando por algumas impressões específicas e impulsos repentinos de sua mente: não; mas, consultando os oráculos de Deus. 'A lei e o testemunho!'. Este é o método geral de saber qual 'a santa e aceitável vontade de Deus'.

23. 'Mas como eu sei qual a vontade de Deus, neste ou naquele caso particular? A coisa proposta é, em si mesma, de uma natureza indiferente; e, assim ficou indeterminada nas Escrituras'.  Eu respondo: As Escrituras, em si mesmas, dão a você uma regra geral, e aplicável a todos os casos específicos: 'A vontade de Deus é nossa santificação'. É através da Sua vontade que podemos ser interior e exteriormente santos; que podemos ser bons, e fazer o bem, de todo o tipo, e no mais alto grau que formos capazes. Deste modo, nós pisamos em chão firme. Isto é tão claro quando a luz do sol. Com o objetivo, portanto, de saber qual a vontade de Deus, em um caso específico, nós temos apenas que aplicar a regra geral. 

24. Suponha, por exemplo, que fosse proposto a um homem razoável casar-se, ou entrar em um novo negócio: Com o objetivo de saber, se esta é a vontade de Deus, estando assegurado de que 'a vontade de Deus, concernente a mim, é que eu possa ser tão santo, e fazer tanto bem quanto eu possa', ele terá apenas que inquirir, 'em qual desses estados eu posso ser mais santo e fazer o bem o mais que eu puder?'. E isto deve ser determinado, parcialmente pela razão; parcialmente, pela experiência. A experiência diz a ele quais as vantagens que ele tem em seu estado atual, quer por ser santo, ou fazer o bem; e a razão irá mostrar o que ele certamente ou provavelmente terá no estado proposto. Comparando esses, ele julgará qual dos dois pode contribuir mais para ser santo e fazer o bem; e quanto mais ele se certifica disto, mais certo ele está de qual é a vontade de Deus.

25. Entretanto, supõe-se a assistência do Espírito de Deus, durante todo o processo de questionamento. Na verdade, não é fácil dizer, em quantas maneiras esta assistência é feita. Ele pode trazer muitas circunstâncias à nossa lembrança; Ele pode colocar outras, em uma luz mais forte e mais clara; pode conscientemente abrir nossas mentes para receberem a convicção e fixarem esta convicção em nossos corações. E para a concomitância de muitas circunstâncias deste tipo, em favor do que é aceitável aos olhos Dele, Ele pode adicionar tal paz inalterada de mente, e tão incomum medida de Seu amor, que não nos deixará possibilidade de dúvida; ou seja, mesmo isto, é a vontade Dele concernente a nós.

26. Este é o caminho claro, bíblico e racional de saber qual a vontade de Deus, em um caso específico. Mas, considerando, quão raramente este caminho é tomado, e a inundação de entusiasmo que precisa ser interrompida nestes que se esforçam para conhecer a vontade de Deus, através de caminhos irracionais e não bíblicos; seria de se esperar que a própria expressão fosse mais frugalmente usada. O uso dela, como alguns fazem, nas ocasiões mais triviais, é uma violação clara do terceiro mandamento. É um caminho grosseiro de tomar o nome de Deus em vão, e mostrar grande irreverência em direção a Ele. Não seria muito melhor, então, usar outras expressões, que não estejam propensas a tais objeções? Por exemplo: em vez de dizer, em alguma ocasião particular, 'Eu quero conhecer qual a vontade de Deus'; não seria melhor dizer, 'Eu quero saber qual vontade é melhor para meu progresso pessoal; e qual me tornará mais útil?'. Esta maneira de falar é clara e inquestionável: É colocar o assunto em uma discussão clara e bíblica, e isto, sem qualquer perigo de entusiasmo.

27. Uma terceira espécie comum de entusiasmo (se não coincide com o anterior), é esta daqueles que pensam atingir a finalidade, sem usar dos meios, através do poder imediato de Deus. Se, de fato, esses meios fossem providencialmente retidos, eles não cairiam nesta responsabilidade. Deus pode, e algumas vezes o faz, em casos desta natureza, manifestar Seu próprio poder imediato. Mas aqueles que esperam isto, quando eles têm esses meios, e não os usam, são propriamente entusiastas. Assim são aqueles que esperam entender as Escrituras santas, sem lê-las, e meditar sobre elas; sim, sem usar de tais ajudas, quando está em seu poder, as quais podem provavelmente, conduzir àquela finalidade.  Tais são aqueles que falam designadamente na assembléia pública, sem qualquer premeditação. Eu digo ''designadamente', porque podem existir tais circunstâncias que algumas vezes, torna isto inevitável. Mas quem quer que menospreze aqueles grandes meios de falar proveitosamente é deste feita um entusiasta.

28. Poder-se-ia esperar que eu fosse mencionar o que alguns consideram seja o quarto tipo de entusiasmo, ou seja, os que imaginam que estas coisas sejam devidas à providência de Deus, quando não são devidas a ela. Mas eu duvido: Eu não sei quais coisas eles têm que não sejam devidas à providência de Deus; na disposição, ou, pelo menos, no governo das quais, ela não diga respeito, quer direta ou remotamente. Eu excetuo nada, a não ser o pecado; e mesmo nos pecados de outros, eu vejo a providência de Deus a mim.  Eu não digo Sua providência geral; porque isto eu considero uma palavra sonante, que significa exatamente nada. E se existe alguma providência específica, ela deve se estender a todas as pessoas e a todas as coisas. Assim, nosso Senhor entende isto, ou Ele nunca teria dito: 'Até mesmo os cabelos de sua cabeça estão numerados'; e, 'Nem um pardal cai ao chão, sem' que seja da vontade 'do Pai' que está nos céus. Mas se for assim, se Deus preside 'sobre todo o universo, como se para cada pessoa em particular, e sobre cada pessoa, como se para todo o Universo'; o que podemos afirmar (exceto apenas com relação aos nossos próprios pecados) que não seja da providência de Deus? De modo que eu não posso compreender que exista algum espaço aqui para a responsabilidade de entusiasmo.

29. Se for dito, a responsabilidade está colocada aqui: 'Quando você imputa isto á Providência, você se imagina o favorito peculiar dos céus': Eu respondo que você se esqueceu de algumas das últimas palavras que eu falei: 'Sua providência está sobre todos os homens no universo, tanto quanto sobre cada pessoa em especial'. Você não vê que aquele que acredita nisto, que imputa alguma coisa que lhe ocorra, como sendo da Providência, nisto ele não se torna mais favorito dos céus, do que ele supõe todo homem debaixo dos céus seja? Portanto, você não tem pretexto, neste alicerce, para responsabilizá-lo com o entusiasmo.

30. Contra toda esta sorte de coisas, convém que tenhamos a máxima diligência; considerando os efeitos danosos que têm sido freqüentemente produzidos, e que, de fato, naturalmente resultam disto. Seu fruto imediato é o orgulho; ele cresce continuamente nesta fonte de onde ele flui; e por meio disto, ele nos aliena mais e mais do favor e da vida de Deus. Ele seca as próprias fontes de fé e amor; de retidão e santidade verdadeira; uma vez que todos esses fluem da graça: mas 'Deus repele o orgulho, e dá a graça', apenas 'para o humilde'.

31. Junto com o orgulho, naturalmente irá surge um espírito inoportuno e não convincente. De modo que, em qualquer erro ou falta que os entusiastas caiam, existe uma pequena esperança de sua recuperação. Já que a razão tem peso pequeno (como tem sido freqüentemente e justamente observado), para aqueles que imaginam que são conduzidos por um guia maior – pela sabedoria imediata de Deus. E quanto mais ele cresce no orgulho, tanto mais ele deve crescer na inconveniência e na obstinação também. Ele será menos capaz de ser convencido; menos suscetível de persuasão; mais e mais atado ao seu próprio julgamento e à sua própria vontade, até que ele esteja completamente preso e imóvel.

32. Estando assim fortalecido pela graça de Deus, e contra todos os conselhos e ajuda do homem, ele está completamente livre da direção de seu próprio coração, e do rei dos filhos do orgulho. Não é de se admirar, então, que ele esteja diariamente mais enraizado e enterrado no desprezo de toda a humanidade; na ira furiosa; em todo tipo de disposição indelicada; em todo tipo de temperamento terreno e pecaminoso. Nem nós podemos nos surpreender com os terríveis efeitos exteriores que têm fluido de tais disposições em todas as épocas; até mesmo, todas as maneiras de maldade. Todas as obras das trevas, cometidas por aqueles que chamam a si mesmos de cristãos, enquanto eles trabalham essas coisas com ganância, como dificilmente foi mencionado, até mesmo em meio aos ateus.

            Tal é a natureza; tais são os efeitos danosos daquele monstro de muitas cabeças, o Entusiasmo! De cujas considerações, nós podemos agora traçar algumas inferências claras, com respeito à nossa própria prática.

33. Em Primeiro Lugar, se o entusiasmo for um termo, embora tão freqüentemente usado, ainda assim, tão raramente entendido, cuide para que você não fale o que você não conhece; não use a palavra, até que você a entenda. Como em todos os outros pontos, então, igualmente neste, aprenda a refletir antes de falar. Primeiro, conheça o significado desta palavra difícil; e, então, a use, se for necessário.

34. Em Segundo, Lugar, se tão poucos, até mesmo entre os homens cultos, quanto mais entre os de tipo comum, entendem esta palavra obscura e ambígua, ou têm alguma noção fixa quanto ao que ela significa, então, cuide de não julgar ou chamar qualquer homem de entusiasta, sobre um relato comum. Este não é, de modo algum, um fundamento suficiente para dar algum nome de reprovação a qualquer homem; menos do que tudo, é um fundamento suficiente para dar um termo tão obscuro de reprovação como este. Quanto mais mal ele contém, mais precaução você deverá ter em como aplicar isto a alguém; levar tão pesada acusação, sem prova completa, sendo tanto consistente com a justiça, quanto com a misericórdia.

35. Mas, se o entusiasmo for um mal tão grande, cuide para que você não se emaranhe nele. Vigie e ore, para que você não caia em tentação. É fácil atacar aqueles que temem ou amam a Deus. Ó, cuide para que você não pense sobre si mesmo, mais do que deveria pensar. Não imagine que você conseguiu a graça, que você não obteve, de Deus. Você pode ter muita alegria; você pode ter uma medida de amor; e, ainda assim, não ter a fé viva. Clame por Deus, para que Ele não permita que você, cego como está, saia do caminho; que você engane a si mesmo, de que é um crente em Cristo, até que Cristo seja revelado em você, e até que Espírito Dele testemunhe com seu espírito que você é um filho de Deus.

36. Cuide para que você não seja um colérico, perseguindo entusiastas. Não imagine que Deus o chamou para destruir (justamente o contrário do espírito Daquele que você chama de seu Mestre) as vidas dos homens, e não para salvá-las. Nunca sonhe em forçar os homens para os caminhos de Deus. Pense por si mesmo, e deixe que pensem. Não use de constrangimento nos assuntos de religião. Mesmo com respeito a estes que estão bem fora do caminho, nunca os obrigue a entrar, seja por um, ou quaisquer outros meios do que a razão, verdade, e amor.

37. Cuide de não fazer como o bando de entusiastas, imaginando que você é um cristão, quando você não é. Não ouse assumir este nome honrado, a menos que você tenha um título claro e bíblico nisto; a menos que você tenha a mente que estava em Cristo, e caminhe como Ele também caminhou.

38. Cuide para que você não caia na segunda espécie de entusiasmo — imaginando que você tem aqueles dons de Deus, que você não tem. Não confie nas visões ou sonhos; em impressões súbitas, ou impulsos fortes de qualquer tipo. Lembre-se que não será por meio destes que você saberá qual é a vontade de Deus, em qualquer ocasião específica, mas aplicando a regra clara das Escrituras, com a ajuda da experiência e razão, e com a assistência extraordinária do Espírito de Deus. Não tome levianamente o nome de Deus em sua boca; não fale da vontade de Deus em toda a ocasião leviana: que suas palavras, assim como suas ações, sejam todas temperadas com reverência e temor divino.

39. Por fim, cuide para não imaginar que você obteve a finalidade, sem usar os meios que conduzem a ela. Deus pode dar os fins, sem quaisquer meios, afinal; mas você não tem motivos para pensar que Ele irá. Portanto, constantemente, e cuidadosamente, use de todos esses meios que Ele tem designado como canais extraordinários de Sua graça. Use todos os meios que tanto a razão quanto as Escrituras recomendam, como condutivos (através do livre amor de Deus em Cristo), tanto para obter, quanto para aumentar alguns dos dons de Deus. Assim, espere crescer diariamente naquela religião pura e santa, que o mundo sempre chamou e sempre irá chamar de 'entusiasmo'; mas que, a todos que são salvos do real entusiasmo; do Cristianismo meramente nominal, trata-se 'da sabedoria de Deus, e do poder de Deus'; da gloriosa imagem do Altíssimo; 'da retidão e paz'; a 'fonte de água viva, brotando para a vida eterna!'.


[Editado anonimamente na Memorial University of Newfoundland com correções de George Lyons para a Wesley Center for Applied Theology.]


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