John Wesley
'E viu o Senhor que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra
e que toda a imaginação dos
pensamentos de seu coração era só má continuamente'. (Gênesis 6:5)
1.
Quão maravilhosamente diferente é isto, dos formosos quadros da natureza humana
que os homens têm esboçado em todas as épocas! Os escritos de muitos dos
anciões abundam com descrições alegres da dignidade do homem; a quem alguns
deles pintam, como tendo todas as virtudes e felicidade em sua composição, ou,
pelo menos, estando inteiramente em seu poder, sem observar a qualquer outra
existência, como auto-suficiente, capaz de viver por sua própria conta, e pouco
inferior ao próprio Deus.
2.
Não se trata apenas dos pagãos; homens que são guiados em suas buscas, por um
pouco mais do que uma pálida luz de razão, mas muitos deles, igualmente, que
testemunham o nome de Cristo, e para os quais foram confiados os oráculos de
Deus, têm falado da natureza do homem, tão magnificamente, como se ela fosse
toda inocência e perfeição. Relatos deste tipo têm particularmente abundado no
presente século; e, talvez, em nenhuma outra parte do mundo mais do que em
nossa própria região. Aqui, não poucas pessoas de forte entendimento, assim
como de extenso aprendizado, têm empregado as mais extremas habilidades, para
mostrarem o que eles denominam de 'o maravilhoso lado da natureza humana'. E
deve-se reconhecer que, se seus relatos forem justos, o homem é 'um pouco
inferior do que os anjos'; ou, como as palavras podem ser mais literalmente
afirmadas, 'um pouco menos do que Deus'.
3.
É de se admirar que esses relatos tenham sido tão prontamente recebidos, pela
generalidade de homens? Quem não é facilmente persuadido a pensar
favoravelmente de si mesmo? Assim sendo, os escritores deste tipo são mais
universalmente lidos, admirados, aplaudidos. E inumeráveis são os convertidos
que eles têm feito, não apenas no mundo leviano, mas no mundo ilustrado. De
modo que agora é completamente fora de moda falar de outro modo; dizer qualquer
coisa para a depreciação da natureza humana; a que geralmente se permite, não
obstante algumas poucas enfermidades, ser muito inocente, sábia e virtuosa!
4.
Mas, neste meio tempo, o que devemos fazer com nossas Bíblias? Porque esses
relatos nunca irão concordar com isto. Como quer que eles agradem à carne e ao
sangue, são extremamente irreconciliáveis com os relatos bíblicos. As
Escrituras asseveram que 'através da desobediência de um homem, todos os
homens foram constituídos pecadores'; que 'em Adão todos morreram' --
morreram espiritualmente, perderam a vida e a imagem de Deus; que aquele
pecador e caído Adão, então, originou um filho à sua própria semelhança';
-- nem seria possível que ele pudesse originá-lo de outra forma, porque 'quem
pode produzir uma coisa pura de uma impureza?'— que, conseqüentemente, nós
estávamos, assim como outros homens, pela natureza, 'mortos nas
transgressões e pecados'; 'sem esperança, e sem Deus no mundo', e,
portanto, 'filhos da ira'; de modo que todo homem podia dizer, 'Eu
fui moldado na iniqüidade; e, no pecado, minha mãe me concebeu'; que 'não
existe diferença', em 'todos que pecaram e não alcançaram a glória de
Deus'; daquela gloriosa imagem de Deus, na qual o homem foi originalmente
criado. E, conseqüentemente, quando 'o Senhor olhou dos céus para os filhos
dos homens, Ele viu que todos eles haviam saído do caminho; que eles haviam se
tornado completamente abomináveis; que não havia um justo; não; nem um',
ninguém que verdadeiramente buscasse a Deus. De acordo com isto, e o que é declarado
pelo Espírito Santo, nas palavras acima citadas, 'Deus viu', quando ele
olhou dos céus, antes, 'que a maldade do homem estava grande na terra';
tão grande, que 'cada imaginação dos pensamentos de seu coração era, tão
somente, continuamente pecaminosa'.
Este é o relato de Deus do homem: Do
qual eu devo aproveitar a oportunidade:
I.
Primeiro, para mostrar o que os homens eram antes do dilúvio:
II.
Segundo, para inquirir, se eles não são da mesma maneira agora:
III.
Terceiro, para acrescentar algumas inferências.
I
1.
Em Primeiro Lugar, eu vou mostrar, esclarecendo as palavras do texto, o que os
homens eram antes do dilúvio. E nós podemos nos basear completamente no relato
fornecido aqui: Porque Deus o viu, e Ele não pode se enganar. Ele 'viu que a
maldade do homem era grande': -- Não este ou aquele homem: não apenas
alguns poucos homens; não meramente uma parte maior, mas o homem em geral; os
homens universalmente. A Palavra inclui toda a raça humana; todos os que fazem
parte da natureza humana. E não é fácil para nós computarmos o número deles,
para dizer quantos milhares ou milhões eles eram. A Terra, então, retinha muito
de sua beleza primitiva e fertilidade original. A face do globo não era rachada
e dividida como ela é agora; e primavera e verão eram bem definidos. É,
portanto, provável que ela proporcionasse sustento para muito mais habitantes
do que é hoje capaz; e esses deviam ser imensamente multiplicados, enquanto os
homens criavam filhos e filhas, por setecentos ou oitocentos anos juntos. Ainda
assim, em meio a todo este número inconcebível, apenas 'Noé encontrou favor
com Deus'. Ele somente (talvez, incluindo parte de sua família) foi uma
exceção à iniqüidade universal, que, pelo justo julgamento de Deus, pouco tempo
depois, foi levada à destruição. Todos os demais foram participantes da mesma
culpa, assim como, da mesma punição.
2.
'Deus viu todas as criações dos pensamentos de seu coração'; -- de sua
alma, de seu homem interior, o espírito dentro dele, o princípio de todos os
seus movimentos internos e externos. Ele 'viu todas as criações': Não é
possível encontrar uma palavra de um significado mais extensivo. Ela inclui o
que quer que seja formado, feito, e fabricado dentro; tudo que existe ou se
passa na alma; toda inclinação, afeição, paixão, apetite; todo temperamento,
desígnio, pensamento. Deve-se, em conseqüência, incluir toda palavra e ação,
como fluindo naturalmente dessas fontes, e sendo tanto boa quanto má, de acordo
com a fonte de onde ela severamente flui.
3.
Deus viu, agora, que tudo isto, o todo disto, era mal; -- contrário à retidão
moral; contrário à natureza de Deus, que necessariamente inclui todo bem;
contrário à vontade divina, o padrão eterno de bem e mal; contrário à imagem
pura e santa de Deus, onde o homem foi originalmente criado, e, onde ele
permaneceu, quando Deus, inspecionando as obras que havia criado, viu, então,
que tudo era muito bom; contrário à justiça, à misericórdia, e verdade, e às
relações essenciais que cada homem tem com seu Criador e seu próximo.
4. Mas
não havia bem misturado com o mal? Não havia luz misturada com a escuridão?
Não; nenhuma afinal: 'Deus viu que o todo da imaginação do coração do homem
era tão somente mau'. E de fato, não se pode negar que muitos deles,
talvez, todos tivessem boas intenções, colocadas em seus corações; uma vez que
o Espírito de Deus também 'empenhava-se com o homem', se, por acaso, ele
pudesse arrepender-se, mais especialmente, durante aquele gracioso adiamento
temporário, de cento e vinte anos, enquanto a arca estava sendo preparada. Mas,
ainda assim, 'em sua carne não habitava coisa alguma boa'; toda sua
natureza era puramente má. Ela era totalmente consistente consigo mesma, e não
misturada com qualquer coisa de uma natureza oposta.
5.
No entanto, ainda pode ser o caso de se perguntar: 'Não havia intermissão
deste mal? Não havia intervalos lúcidos, em que alguma coisa boa pudesse ser
encontrada no coração do homem?'. Nós não vamos considerar aqui o que a
graça de Deus poderia ocasionalmente operar em sua alma; e, abstraídos disto,
nós não temos motivos para acreditar que houvesse alguma intermissão daquele
mal. Porque Deus, que 'viu que o todo da imaginação dos pensamentos de seu
coração era tão somente mau', viu, igualmente, que ele sempre foi o mesmo;
que ele 'era mau, continuamente'; cada ano; cada dia; cada hora; e cada
momento. Ele nunca se desviou para o bem.
II
Tal
é o relato autêntico de toda a raça humana, que Ele que conhece o que está no
homem; que sonda o coração e testa as afeições, tem deixado registrado para
nossa instrução. Tais eram todos os homens antes que Deus trouxesse o dilúvio
sobre a terra.
Nós
vamos, agora, em Segundo Lugar, inquirir se eles são o mesmo agora.
1.
E isto é certo, as Escrituras não nos dão motivo para pensar de alguma forma
diferente delas. Do contrário, todas as passagens das Escrituras citadas acima
se referem àqueles que viveram depois do dilúvio. Acima de mil anos antes que
Deus declarasse, através de Davi, com respeito aos filhos dos homens: 'Todos
eles saíram do caminho da verdade e santidade; não existe alguém justo; nem
um'.
E
a isto, testemunham todos os profetas, em suas diversas gerações. Como Isaias,
concernente ao povo peculiar de Deus, (e certamente os ateus não estavam em
melhor condição): 'Toda a mente está doente; e todo o coração
desfalece. Dos pés à cabeça, não existe
sanidade; mas machucaduras, e injúria, e feridas pútridas'. O mesmo relato é dado por todos os
Apóstolos; sim, através de todo o teor dos oráculos de Deus. De tudo isto, nós
aprendemos, concernente ao homem em seu estado natural, não auxiliado pela
graça de Deus, que 'cada imaginação dos pensamentos de seu coração é'
ainda 'mau; tão somente mau', e 'continuamente mau'.
2.
Este relato do presente estado do homem é confirmado por experiências,
diariamente. É verdade que o homem natural não se preocupa com ele. E isto não
é de se admirar. Por quanto tempo um homem nascido cego continuar assim, ele
dificilmente estará consciente de sua necessidade: Muito menos poderíamos supor
um lugar onde todos que foram nascidos sem luz, pudessem estar conscientes da
necessidade dela. De igual maneira, por quanto tempo os homens permaneçam em
sua cegueira natural de entendimento, eles não estão conscientes de suas
necessidades espirituais, e, em particular, deste. Mas, tão logo Deus abra os
olhos de seu entendimento, eles vêem o estado que eles estavam anteriormente;
eles estão, completamente convencidos que 'cada homem vivente',
especialmente eles mesmos, é, pela natureza, 'completamente vaidade'; ou
seja, insensatez e ignorância; pecado e maldade.
3.
Quando Deus abre nossos olhos, vemos que estávamos antes, sem Deus, ou melhor,
éramos ateístas, no mundo. Tínhamos, pela natureza, nenhum conhecimento de
Deus; nenhuma familiaridade com ele. É verdade, que tão logo começamos a usar a
razão, tomamos conhecimento 'das coisas invisíveis de Deus, até mesmo seu
poder eterno e Divindade, das coisas que estão feitas'. Das coisas que são
vistas, inferimos a existência de um Ser poderoso e eterno, que não é visível.
Mas ainda assim, embora reconheçamos sua existência, nós não temos
familiaridade com Ele.
Assim
como sabemos que existe um Imperador da China, a quem ainda não conhecemos; nós
sabíamos que existia um Rei de toda a Terra, ainda assim, não o conhecemos. Na
verdade, não poderíamos, através de qualquer uma de nossas faculdades naturais.
Através de nenhuma dessas, poderíamos obter o conhecimento de Deus. Não
poderíamos percebê-lo mais do que vê-lo com nossos olhos. Porque 'ninguém
conhece o Pai, a não ser o Filho, e ele a quem o Filho irá revelá-lo'.
4.
Nós lemos de um rei antigo, que, estando desejoso de saber qual era a língua
natural dos homens, com o objetivo de trazer o assunto para um certo debate,
fez o seguinte experimento: Ele ordenou que duas crianças, tão logo elas tinham
nascido, fossem transportadas para um lugar preparado para elas, onde elas
foram levadas, sem qualquer instrução, afinal, e sem nunca ouvir uma voz
humana. E o que aconteceu? Aconteceu que quando elas foram, por fim, trazidas
para fora do seu confinamento, elas não falaram língua alguma, afinal; apenas
articulavam apenas alguns sons estranhos, como aqueles de outros animais. Que
essas duas crianças foram, da mesma maneira, trazidas do útero, sem serem
instruídas em alguma religião, não havia motivo para dúvida, mas (a menos que a
graça de Deus se interpusesse), o evento seria justamente o mesmo. Elas não
teriam religião, afinal. Elas não teriam mais conhecimento de Deus do que as
bestas do campo; do que o selvagem potro. Tal é a religião natural, abstraída
da tradicional, e das influências do Espírito de Deus!
5.
E não tendo conhecimento, não podemos ter o amor de Deus: Não podemos amar o
que não conhecemos. A maioria dos homens fala, de fato, do Deus amoroso, e,
talvez, imaginam que eles conheçam; pelo menos, alguns irão reconhecer que eles
não O amam: Mas o fato é muito claro para ser negado.Nenhum homem ama a Deus,
através da natureza, mais do que ele o faz a uma pedra, ou à terra que ele
pisa. No que nós amamos, nós nos deleitamos: Mas nenhum homem tem naturalmente
qualquer deleite em Deus. Em nosso estado natural, não podemos conceber como
alguém poderia deleitar-se Nele. Nós não temos prazer nele, afinal; ele é
extremamente insípido para nós. Amar a Deus! Está muito além de nossas vistas.
Nós não podemos alcançar isto, naturalmente.
6.
Pela natureza humana, tão somente, não temos amor, mas também, medo de Deus. Na
verdade, é certo que a maioria dos homens tem, mais cedo ou mais tarde, uma
forma de medo irracional e inconsciente, propriamente chamado de superstição;
embora os descuidados epicuristas tenham dado a isto o nome de religião. Ainda
assim, isto não é natural, mas adquirido; principalmente, através de conversa
ou de exemplo. Pela natureza, 'Deus não está em todos os nossos pensamentos':
Nós o deixamos manejar seus próprios assuntos, sentado-se quietamente, como
imaginamos, no céu, e nos deixando na terra, para manejarmos os nossos; de modo
que não temos mais temor de Deus, diante de nossos olhos, do que o amor de
Deus, em nossos corações.
7.
Assim, são todos os homens 'ateus no mundo'. Mas o próprio ateísmo não
nos protege da idolatria. Em seu estado natural, cada homem nascido no mundo é
um idólatra completo. Talvez, não deve ser de tal maneira no sentido comum da
palavra. Nós não adoramos, como os idólatras ateus, ferro fundido ou imagens
esculpidas. Nós não nos curvamos a um tronco de uma árvore; ao trabalho de
nossas próprias mãos. Nós não oramos para os anjos ou santos nos céus, não mais
do que os santos que estão sobre a Terra. Mas o que acontece, então? Nós temos
fixado nossos ídolos em nossos corações; e a estes nós nos curvamos e adoramos.
Nós adoramos a nós mesmos, quando concedemos que a honra, que é devida somente
a Deus, seja dada a nós. E, embora o orgulho não fosse criado para o homem,
ainda assim, onde está o homem que nasceu sem ele? Assim sendo, roubamos de
Deus seu inalienável direito e idolatricamente usurpamos sua glória.
8.
Mas o orgulho não é apenas uma espécie de idolatria, da qual somos todos culpados
pela natureza. Satanás tem estampado sua própria imagem em nosso coração na
vontade própria também. 'Eu irei', ele disse, antes de ser expulso do
paraíso, 'Eu me assentarei aos lados do norte'; Eu farei minha vontade e
prazer; independentemente daquela de meu Criador.
'E tu
dizias no teu coração: Eu subirei ao céu, acima das estrelas de Deus exaltarei
o meu trono, e no monte da congregação me assentarei, aos lados do norte'. (Isaías
14:13)
O
mesmo cada homem nascido no mundo diz, e isto, em milhares de instâncias; mais
ainda, e declara isto também, sem nunca corar diante do relato; sem temer ou
envergonhar-se.
Pergunte
ao homem: 'Por que você faria isto?'. Ele responderá: 'Porque eu
estou inclinado a fazê-lo''. O que é
isto, senão, 'porque é da minha vontade'; ou seja, em efeito, porque o
diabo e eu concordamos; porque Satanás e eu governamos nossas ações, através de
um e do mesmo princípio. A vontade de Deus, neste meio tempo, não está em seus
pensamentos; ela não é considerada no menor grau: embora seja a regra suprema
de toda criatura inteligente; quer no céu, quer na terra, resultante da relação
essencial e inalterada que toda criatura testemunhe seu Criador.
9.
Desta mesma forma, levamos a imagem do diabo, e trilhamos seus passos, Mas, no
próximo passo, deixamos satanás para trás; nós seguimos uma idolatria, em que
ele não é o culpado: eu quero dizer o amor do mundo; que é agora tão natural a
cada homem, quanto amar a sua vontade própria. O que é mais natural para nós,
do que buscar felicidade na criatura, em vez do Criador? – buscar aquela
satisfação nas obras de suas mãos, e que pode ser encontrada apenas em Deus? O
que é mais natural, do que o 'desejo da carne?'. Ou seja, do prazer do
sentido de todo tipo? Os homens, de fato, falam magnificamente de despirem-se
desses prazeres inferiores, particularmente, os homens de aprendizado e
educação. Eles simulam se libertarem da gratificação desses apetites, em que
eles se situam no mesmo nível que as bestas que perecem. Mas é mero fingimento;
porque cada homem é consciente de que, neste aspecto, ele é, pela natureza, a
mesma besta. Apetites sexuais, até mesmo aqueles do tipo mais inferior, têm,
mais ou menos, um domínio sobre ele. Eles o conduzem cativo; eles o arrastam
para um lado e para o outro, a despeito de sua razão ostentada. O homem, com
toda sua boa educação, e outros complementos, não tem primazia sobre uma cabra:
mais ainda, é para se duvidar, se a besta não tem primazia sobre ele. Certamente, ele tem, se nós podemos ouvir
atentamente a algum dos seus oráculos modernos, quem muito decentemente nos
diz: Numa determinada época, as bestas também provam do amor; apenas a besta
da razão é sua escrava, e, nesta insensatez, ocupa-se o ano todo.
Uma diferença considerável, de fato,
deve-se admitir, existe entre os homens (além daquela forjada pela graça
preventiva), surgindo da diferença de constituição e educação. Mas, não
obstante isto, quem, que não seja ignorante de si mesmo, pode aqui atirar a
primeira pedra no outro? Quem pode suportar o teste da observação de nosso
amado Senhor, no sétimo mandamento: 'aquele que olhar para uma mulher, para
cobiçá-la, já em seu coração, cometeu adultério?'. De modo que não se sabe
do que se admirar mais, se da ignorância, ou da insolência daqueles homens que
falam com tal desdém daqueles que são dominados pelos desejos que todo homem
tem sentido em seu próprio peito; o desejo de cada prazer do sentido, inocente
ou não, sendo natural a todo filho do homem.
10.
E assim é 'o desejo dos olhos'; o desejo dos prazeres da imaginação.
Esses surgem tanto dos grandes, quando dos objetos bonitos e incomuns; -- se os
dois primeiros não coincidem com o último, visto que, talvez, possa parecer,
numa sindicância zelosa, que nem os objetos grandes, nem os bonitos agradam
mais do que aqueles que são novos; quando a novidade deles acaba, a maior
parte, pelo menos, do prazer que eles proporcionavam termina; e na mesma
proporção que eles se tornam familiares, eles se tornam vazios e insípidos. Mas
mesmo que experimentemos isto tão freqüentemente, o mesmo desejo irá ainda
permanecer. A sede inata continua fixada na alma; mais do que isto: quanto mais
temos indulgência, mais ela aumenta, e nos incita a seguir atrás de outro, e
outro objeto mesmo assim; embora deixemos cada um com uma esperança fracassada,
e uma expectativa iludida.
11.
Um terceiro sintoma dessa doença fatal, o amor do mundo, que está tão
profundamente enraizado em nossa natureza, é o orgulho da vida'; o
desejo do reconhecimento, da honra que vem dos homens. Os maiores admiradores
da natureza humana admitem que isto seja estritamente natural; tão natural
quanto ver, ouvir, ou qualquer outro dos sentidos externos. E será que eles
estão envergonhados disto, mesmo os homens letrados; homens refinados e de
grande entendimento? Muito longe disto, eles se gloriam neste sentido! Eles
aplaudem a si mesmos, por causa do amor deles pelo aplauso! Sim; cristãos
eminentes, assim chamados, não têm dificuldade em adotar o dizer do velho ateu
vaidoso: 'Não considerar o que os homens pensam sobre nós, é a marca de uma
mente enfraquecida e abandonada'. Assim, ir com calma e equilibrado,
através da honra e desonra; através de um relato bom ou ruim, é, para eles,
sinal de alguém que não está, na verdade, adequado para viver: 'Fora da terra
com tal disposição'. Mas alguém imaginaria que esses homens ouviram de
Jesus Cristo ou de seus Apóstolos; ou que eles soubessem quem foi que disse: 'Como
você pode acreditar em alguém que recebe honra de outro, e não busca a honra
que vem de Deus somente?'. Mas, se isto é realmente assim; se for
impossível acreditar, e conseqüentemente agradar a Deus, por quanto tempo
recebemos ou buscamos a honra de uns dos outros, e não a honra que vem de Deus
apenas, então, em que condição está a humanidade! Os cristãos, assim como os
pagãos; uma vez que todos buscam honra um do outro! Uma vez que seja natural
para eles procederem desta forma; sendo eles mesmos os juízes; assim como é
natural ver a luz que toca seus olhos, ou ouvir o som que entrar por seus
ouvidos; sim, uma vez que eles consideram isto um sinal de uma mente vitoriosa,
contentar-se com a honra que vem de Deus apenas!
III
1. Eu
prossigo, esboçando algumas inferências do que foi dito. Primeiro, que disto
podemos aprender uma grande e fundamental diferença entre o Cristianismo,
considerado como um sistema de doutrinas, e a maioria do refinado Ateísmo.
Muitos dos antigos ateus têm descrito largamente a tendência habitual
condenável de homens específicos. Eles têm falado muito contra a avareza,
crueldade, luxúria, e prodigalidade deles. Alguns se atreveram a dizer que 'nenhum
homem nasce sem essa tendência condenável, de uma espécie ou de outra'. Mas
como ainda nenhum deles foram avisados da queda do homem, então, nenhum deles
sabe de sua total corrupção. Eles não souberam que todo homem foi esvaziado de
todo bem, e preenchido com toda forma de mal. Eles eram totalmente ignorantes
da completa depravação de toda natureza humana, de cada homem nascido no mundo,
em toda faculdade de sua alma; não tanto devido àquelas tendências específicas,
que reinam em pessoas específicas, como por meio da inundação geral de ateísmo
e idolatria, do orgulho, da vontade própria, e amor do mundo. Isto, por
conseguinte, é o primeiro grande ponto de distinção entre Ateísmo e Cristianismo.
Um reconhece que muitos homens estão infectados com muitos vícios, e, até
mesmo, nascem com uma propensão a eles; mas supõe, além disto, que em alguns o
bem natural contrabalança em muito o mal: O outro declara que todos os homens
são concebidos no pecado, 'e moldados na maldade', -- que,
conseqüentemente, existe em cada homem 'uma mente carnal que é inimiga de
Deus; que não é, nem pode ser, objeto de' sua 'lei'; e que assim
infecta toda a alma; que 'habita' nele, 'em sua carne', em seu
estado natural, 'nenhuma coisa boa', mas 'cada pensamento de seu
coração é mau', e tão somente mau; e isto, 'continuamente'.
2.
Conseqüentemente, podemos aprender, em Segundo Lugar, que todo aquele que nega
isto; que o chama de pecado original; ou por algum outro título, são ainda
considerados ateus, no ponto fundamental que diferencia o Ateísmo do
Cristianismo. Eles podem, na verdade, admitir que os homens têm muitos vícios;
que alguns desses vícios nasceram conosco; e que, conseqüentemente, não
nascemos completamente tão sábios, ou tão virtuosos, como deveria ser;
existindo poucos que irão afirmar redondamente: 'Nós nascemos com propensão,
tanto para o bem, quanto para o mal; e todo homem, pela natureza, é virtuoso e
sábio, tanto quanto Adão foi quando de sua criação'. Mas aqui está o lema:
Será que, pela natureza, o homem está preenchido com toda forma de mal? Ele
está vazio de todo bem? Ele está totalmente caído? Sua alma é totalmente
corrupta? Ou, para voltarmos ao texto, 'toda imaginação dos pensamentos de
seu coração são tão somente maus, e isto, continuamente?'. Se admitir isto,
você estará longe de ser um cristão. Negar isto, você, ainda assim, será um
ateu.
3. Nós
podemos aprender isto, em Terceiro Lugar, qual é a natureza própria da
religião; da religião de Jesus Cristo. A terapia da alma é o método de Deus
para curar uma alma que está assim doente. Por isto, o grande Médico das almas
aplica medicamentos para curar esta enfermidade, para restaurar a natureza
humana, totalmente corrupta, em todas as suas faculdades. Deus cura todo o
nosso Ateísmo, através do conhecimento de Si Mesmo, e de Jesus Cristo, a quem
Ele enviou; nos fortalecendo na fé, uma evidência e convicção divina de Deus, e
das coisas de Deus, -- em específico, desta importante verdade, 'Cristo me
amou – e deu a Si mesmo por mim'. Pelo arrependimento e mansidão de
coração, a doença mortal do orgulho é curada; através da resignação, humildade
e submissão agradecida à vontade de Deus, a vontade própria é curada; o amor de
Deus sendo o remédio soberano para o amor do mundo, em todas as suas
ramificações. Agora, isto é propriamente religião; é a 'fé', assim, 'operando
através do amor'; operando a mansidão humilde genuína, a morte completa
para o mundo, com o amor, e a aquiescência grata nele, e conformidade para com
toda a vontade e Palavra de Deus.
4.
De fato, se o homem não tivesse, assim, caído, não haveria necessidade de tudo
isto. Não haveria oportunidade para este operar no coração; este renovar no
espírito de nossa mente. A superficialidade da religiosidade seria, então, uma
mera expressão própria, assim como a 'superficialidade da perversidade'.
Porque uma religião exterior, sem qualquer religiosidade, afinal, seria
suficiente para todos os intentos e propósitos racionais. Assim sendo, seria
suficiente, no julgamento daqueles que negam esta corrupção de nossa natureza.
Eles fazem muito pouco mais da religião, do que o famoso Sr. Hobbes fez da
razão. De acordo com ele, a razão é apenas 'uma bem organizada série de
palavras': De acordo com eles, a religião é apenas uma bem organizada série
de palavras e ações. E eles falam consistentemente consigo, mesmos, porque se o
interior não for cheio de maldade; se isto já estiver limpo, o que permanece, a
não ser 'a limpeza do exterior de uma xícara?'. A reforma exterior, se a
suposição deles for justa, é de fato, alguma coisa necessária.
5. Mas
nós não temos aprendido assim dos oráculos de Deus. Nós sabemos que aquele que
busca o que está no homem faz um relato diferente, tanto da natureza quanto da
graça, de nossa queda e nossa recuperação.
Nós sabemos que a grande finalidade da religião é renovar nossos
corações na imagem de Deus; reparar aquela perda total de retidão e santidade
verdadeira, que nós mantivemos, por conta do pecado de nosso primeiro antepassado.
Ainda assim, sabemos que toda religião que não responde a esta finalidade; toda
sorte de interrupção disto, da renovação de nossa alma na imagem de Deus, em
busca da similitude Dele que a criou, não é outra do que uma pobre farsa, e uma
mera zombaria de Deus, para a destruição de nossa própria alma. Oh! Previna-se
daqueles professores de mentiras, que impingiria isto sobre você, como
Cristianismo! Não os leve em consideração, embora eles venham até você, com
toda o engano da iniqüidade; com toda lisura da linguagem; toda decência; sim,
beleza e elegância de expressão; todas as declarações de boa vontade sincera
para com você, e reverência para com as Santas Escrituras. Mantenha o plano da
velha fé, 'uma vez, entregue aos santos', e entregue pelo Espírito de
Deus aos nossos corações. Conheça a sua enfermidade! Conheça a sua cura! Você
nasceu no pecado: Por conseguinte, 'você deve nascer de novo'; nascer de
Deus. Pela natureza, você é totalmente corrupto. Pela graça, você está
totalmente renovado. Em Adão, todos morremos: No segundo Adão, em Cristo, todos
fomos trazidos à vida. 'Você que estava morto nos pecados, Ele tem
vivificado'. Ele já deu a você o princípio da vida; até mesmo a fé Nele,
que o amou e deu a Si mesmo por você! Agora, 'vai de fé em fé', até que
toda a doença será curada; e toda aquela 'mente que esteve em Jesus Cristo,
esteja também em você'.
[Editado
por George Lyons da Northwest Nazarene College (Nampa, ID), para a Wesley
Center for Applied Theology.]